Mateus de Andrade Pacheco


SINTA O SOM: HISTÓRIA E MÚSICA EM SALA DE AULA


Há canções e há momentos
Eu não sei como explicar
Em que a voz é um instrumento
Que eu não posso controlar
Ela vai ao infinito
Ela amarra todos nós
E é um só sentimento
Na plateia e na voz”

Cantar não seria apenas um dom. Música é partilha, convite a estar junto, seja numa multidão ou quando sozinho num quarto escuro repetindo diversas vezes a mesma canção. Por meio da música é possível elaborar identificações, traduzir memórias, evocar sentimentos e emoções. O que nos aparece em alerta nos versos acima recortados da música “Canções e Momentos”, de Milton Nascimento e Fernando Brant, é emoldurado por apurada sensibilidade. É essa sensibilidade que ronda, teima em fazer contato, ergue pontes. Esse é um detalhe que não devemos perder de vista quando optamos por trabalhar com uma canção em sala de aula.

Há algum tempo os contextos escolares já têm estimulado professores a explorarem novas linguagens e materiais em sala de aula para enriquecer ainda mais o percurso de seus estudantes. Tanto por iniciativa dos próprios professores quanto por sugestão de livros didáticos, a música aparece como um campo fértil a ser visitado e explorado nessa empreitada. No entanto, muitas vezes, a abordagem de repertórios e mais repertórios de canções não ultrapassa uma análise fria da letra, que faz pensar que esta é mais um depósito de conteúdo do que um discurso vivo, pronto à interação e interpretação. Dessa maneira, além de entendermos como interessante o trabalho com canções em sala de aula, acreditamos que é necessário pensarmos em formas de abordá-las, de pensá-las. Não adianta termos novos suportes se permanecermos com as mesmas posturas. É preciso mudar o enquadramento, e no caso do trabalho com a música no ensino de história, creio que se faz necessário entrar no universo discursivo de uma canção, perceber como ela se constrói, entra em contato com seu público e transita por sentidos plurais. É esse percurso que nos propomos a traçar no espaço desse artigo, buscando promover pelo debate posturas que nos permitam enveredar pelo fértil terreno da música numa perspectiva histórica.

Talvez por essa via devolvamos à música sua capacidade de chamar atenção, de estabelecer uma ligação com seu público alvo, neste caso os alunos. É interessante recorrermos para isso ao diálogo com a universidade, que atualmente estabelece diversas maneiras de se estudar fenômenos e manifestações musicais. No campo historiográfico, uma via frutífera para se abordar o tema foi estabelecida pela História Cultural. Dessa vertente recorre-se a noções que ajudam em nossa reflexão, como é o caso da noção de representação social e de categorias como identidades e memórias.

No entanto, nesse espaço de nossa reflexão creio que seja fundamental nos atermos à noção de apropriação, que como nos lembra Chartier “enfatiza a pluralidade dos empregos e das compreensões e a liberdade criadora – mesmo que seja regrada – dos agentes que nem os textos nem as normas impõem.” [Chartier, 2002, p. 67] Nesse sentido, a apropriação debruça-se sobre “uma história social dos usos e das interpretações, relacionados às suas determinações fundamentais e inscritos nas práticas específicas que os produzem.” [Chartier, 2002, p. 68] Tais afirmações retiram os engessamentos que circundam as leituras de um texto e salientam seu caráter móvel, aberto, livre à interpretação, olhar que transpomos para análises musicais. Assim, ampliamos as possibilidades de análise e de participações variadas na construção de sentidos.  Mas o que tem isso a ver com o uso da música em sala de aula? Tudo! A partir desse tipo de abordagem, que leva em consideração interpretações plurais, abre-se o canal para que os alunos se sintam à vontade para debater o conteúdo de uma canção, sem se preocuparem em dar “a resposta” certa ou esperada. Está aí uma mudança de postura e é nesse ponto que as reflexões estabelecidas na universidade podem ajudar.  O que estimulamos nas páginas desse breve artigo está longe de ser uma receita de como trabalhar com música em sala de aula. A preocupação básica é a mudança de olhar, que informe as práticas adotadas por professores, pois as formas de estabelecer tal contato são variadas. A respeito desse debate, Circe Bittencourt acrescenta:

“A contribuição dos historiadores também é significativa em virtude do método de análise dessa documentação, a qual possui uma linguagem específica, associando vários componentes e diferentes sujeitos, a saber: o autor, intérprete, músicos, gravadores, produtores e técnicos, além de consumidores.” [Bittencourt, 2008, p.381]

Nesse sentido, percebe-se a música como uma construção, uma elaboração subjetiva, verdadeiro caldeirão de interpretações em que autores, intérpretes e músicos situam-se no mundo, refletem sobre a realidade em que estão inseridos e mesmo [re]criam imagens de sua cultura e de seu país. Talvez por isso seja tão recorrente buscar nela interpretações sobre eventos históricos e sobre diversas manifestações que povoam o cotidiano de épocas distintas.  Esse caráter aberto das canções, interessaram-me em pesquisas anteriores. Para termos um exemplo, busquei refletir em minha pesquisa de mestrado sobre como a cantora Elis Regina retratou a realidade brasileira a partir de quatro espetáculos musicais levados aos palcos na década de 1970. Logo se desenhou como fator relevante o papel da intérprete na elaboração dos sentidos das canções que cantava. Tal questão fez com que eu me detivesse na análise da performance de Elis Regina. Passava a ser crucial que eu percebesse seus gestos, as nuanças vocais, a respiração, a expressão do rosto. Tudo ali contribuía para se compor e recompor sentidos. “Diferentemente de um simples transmissor de discursos, a intérprete, ao cantar uma canção, imprime nela sua marca, vale-se de suas referências musicais, de sua bagagem cultural, que faz de sua leitura daquela canção uma diferente forma de percebê-la.” [Pacheco, 2009, p.26]

Tais debates podem muito bem ser transpostos para sala de aula. Creio que um dos principais pontos a serem levados em conta é a escuta apurada. Parece óbvio sugerir que alguém escute uma canção ou assista com cuidado uma performance em vídeo. Mas esse é um caminho fundamental, desarmar-se para escutar o que é dito, absorver detalhes, perceber o que um som lhe transmite, que sensibilidade a atmosfera sonora, a voz, os arranjos, a letra, a melodia enredam em sua percepção. Em texto que reflete sobre o Clube da Esquina, o professor e pesquisador Ivan Vilela demonstra as possibilidades de aprofundamento das percepções sobre uma canção a partir de uma escuta apurada [Vilela, 2010]. Essa mesma conduta se percebe em suas aulas, em que a escuta seguida de análise detalhada fica em foco. Foi pelas mãos de Ivan Vilela que me chegou um artigo de Jorge Larrosa Bondía que fortalece essa linha argumentativa:

“A experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço.” [Bondía, 2002, p. 24]

Abandonar o preestabelecido, o caminho já degastado e se dispor a encontrar meios de estabelecer formas criativas e afetivas de ensino, eis o que perpassa o discurso recortado. Creio que tal postura pode nos inspirar formas de abordar a música também no ensino fundamental e médio. A partir de uma reflexão sobre os detalhes, sobre como uma canção vai elaborando seus sentidos, o aluno é convidado a se juntar, a elaborar possibilidades e perceber sons. Neste cenário torna-se ainda fundamental se atentar para a maneira que o discurso poético se desenrola, suas possibilidades de comunicação, e como ele é móvel quando se vale de figuras como metáforas, de sensibilidades. Esse plano aberto, pronto a arregimentar sentidos, os do autor, intérpretes e até mesmo do público, permite que aluno, além de perceber um momento histórico específico, posicionamentos sobre contextos culturais e sociais, elabore pontes, perceba-se ali, faça da sensibilidade uma ponte erguida em continuidades e descontinuidades.
        
Se num primeiro momento essa ideia pode parecer pouco palpável, ela ganha contornos mais claros quando miramos nosso cenário atual. Em tempos de incertezas, em que o amanhã parece obscuro, como é o momento atual, vivido sob o medo das consequências de uma pandemia, algumas canções dos anos 1960/1970 ganham as redes sociais servindo para dar voz as angústias de agora. Foi assim que a canção “O dia em que a terra parou”, de Raul seixas e Cláudio Roberto tomou ares proféticos em “posts” de muitos usuários de redes sociais:

Essa noite, eu tive um sonho de sonhador
Maluco que sou, eu sonhei
Com o dia em que a Terra parou
Com o dia em que a Terra parou
Foi assim
No dia em que todas as pessoas
Do planeta inteiro
Resolveram que ninguém ia sair de casa
Como que se fosse combinado em todo
O planeta
Naquele dia, ninguém saiu de casa [...]”

A canção, elaborada sem se firmar num cenário pronto e estabelecido passa a servir a momentos diversos, como à atualidade. Pela subjetividade e mobilidade do discurso musical/poético, vários versos parecem caber tão bem a situação atual e são retomados pelo público, que faz de um repertório de canções uma espécie de lugar de memória. Assim, identificamo-nos com versos como “... qualquer dia amigo a gente vai se encontrar...”, de Milton Nascimento e Fernando Brant, ou “que notícias me dão dos amigos? / que notícia me dão de você?”, também de Milton, mas em parceria com Ronaldo Bastos; ou com os versos da canção “Cartomante”, de Ivan Lins e Vitor Martins, compartilhados freneticamente pelo público de Elis Regina:

“Nos dias de hoje/É bom que se proteja/Ofereça a face/ Pra quem quer que seja/ Nos dias de hoje/Esteja tranquilo/ Haja o que houver/ Pense nos seus filhos/ Não ande nos bares/ Esqueça os amigos/ Não pare nas praças/ Não corra perigo/ Não fale do medo/ Que temos da vida/ Não ponha o dedo/ Na nossa ferida/ Nos dias de hoje/ Não lhes dê motivo/ Porque na verdade/ Eu te quero vivo/ Tenha paciência/ Deus está contigo/ Deus está conosco/ até o pescoço/ Já está escrito/ Já está previsto/ Por todas as videntes/ Pelas Cartomantes/ Tá tudo nas cartas/ Em todas as estrelas/ No jogo dos búzios/ E nas profecias/ Cai o rei de espadas/ Cai o rei de ouros/ Cai o rei de paus/ Cai não fica nada.”

O interpretação que ganhou as redes sociais é facilmente encontrada no youtube. Trata-se de um show realizado por Elis Regina em Lisboa em 1978. Naquele momento ela estava em turnê com o “Transversal do Tempo”, um espetáculo de crítica social e política, de atmosfera densa e aguerrida. É nessa atmosfera que se dá a interpretação de Cartomante. Nos primeiros versos da canção, Elis põe-se de joelhos. Acompanhada quase que somente pelo piano, o clima é coberto por melancolia e tristeza. Cada verso é pronunciado com ênfase. A angústia presente na voz, adensa-se pela expressão facial tensa, um olhar que pede socorro e ao mesmo tempo atenção para o que era dito. Elis porta-se como narradora pronta a falar de seu tempo, do receio e medo de viver em vigília e vigiada, o medo de um cotidiano marcado pela ditadura militar. 

Mas no decorrer da performance o medo verte-se em raiva, estimula a coragem na certeza de que aquilo acabaria na ênfase dada ao refrão: “cai o rei....”. O ambiente ganha tons cartáticos quando invadido pela estridência da guitarra e pela pulsação forte da bateria. É quase uma euforia desenhada numa ambiência urbana. De pé e altiva Elis encarna a resistência.

O que extraímos nessa interpretação, comunica-se fortemente com cenário atual de medo, insegurança, angústia diante da pandemia que assola o mundo. Soma-se a isso a tensão do cenário brasileiro, pautado por conturbações políticas e protesto diante das posturas do governo em relação ao combate à doença. O “cai o rei” daquela época parece ecoar nos “panelaços” da atualidade. Novamente os versos plantados na subjetividade florescem em campos diversos. A música que retrata o cenário daquela ditadura bem cabe para traduzir o sentimento contemporâneo. Se aqui podemos perceber linhas de continuidade, também, mais uma vez, visualizamos a mobilidade discursiva de uma canção, pronta a servir de peça para outras histórias.

Se é clara essa mobilidade também podemos considerar que é justamente ela um dos canais que faz uma canção afetar seu público, inclusive o composto por alunos. No breve percurso que aqui traçamos, um dos caminhos que esboçamos como ponto de partida para que uma canção seja trabalhada em sala de aula é deixar o aluno se afetar, embarcar no discurso daquela canção, ouvi-la com atenção, esmiuçar suas linhas melódicas e poéticas, deixar-se levar, participar. Talvez por isso mesmo, uma das vias para se trabalhar com música seja tomar como partida o agora, o solo do estudante, para depois jogar-se em digressões que demonstram que aquela canção tem história, mas não está petrificada.

REFERÊNCIAS
Mateus de Andrade Pacheco é doutor em História pela Universidade de Brasília [UnB] e possui pós-doutorado em Sociologia pela Universidade do Porto. Membro do “História e Música: compondo identidades, fazendo história”, grupo registrado no Diretório de Pesquisas do CNPq, o pesquisador trabalha com música brasileira, cultura popular, dentre outras manifestações do cotidiano. 

BITTENCOURT, Circe. Ensino de história: fundamentos e métodos. 2. ed. São Paulo: Cortez. 2008.
 BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber da experiência. Revista Brasileira de Educação. Nº 19. Rio de Janeiro: Jan/Fev/Mar/Abr de 2002.
CHARTIER, Roger. À beira da falésia: a história entre incertezas e inquietude. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2002.
PACHECO, Mateus de Andrade. Elis de todos os palcos: embriaguez equilibrista que se fez canção. Dissertação de Mestrado. Universidade de Brasília. Programa de Pós-graduação em História da Universidade de Brasília, 2009
VILELA, Ivan. Nada ficou como antes In: Revista USP. São Paulo, n.87, p. 14-27, setembro/novembro 2010. 

47 comentários:

  1. Gostei muito do seu texto. A questão de uma escuta mais apurada é muito interessante. Como você analisa a imposição de um suposto "bom gosto" em oposição à manifestações culturais, geralmente populares entre os estudantes mais jovens?

    Kenia Gusmão mederiros

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    1. Kenia, acredito que em termos de sala de aula deve-se tentar ultrapassar as classificações entre música de bom gosto, popular ou "popularesca". Considerada como manifestação cultural em que nos situamos no mundo, a música ergue memórias, elabora identidades, independentemente do estilo ou gênero musical. Então para a história tudo isso interessa... O importante é saber trabalhá-las, contextualizá-las, escolhe-las de acordo com a temática que deseja abordar. Por vezes somos mesmo levados a eleger um gênero, mas é sempre bom deixar um espaço para outras vozes que podem trazer questões interessantes para o debate. Obrigado pela pergunta, ela dá para pensar muita coisa.

      Mateus de Andrade Pacheco

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    2. Obrigada, Mateus!

      Kenia Gusmão Medeiros.

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  3. Interessante a sua abordagem sobre determinada atemporalidade que algumas canções possuem, podendo ser aplicadas a contextos atuais, ainda que pensadas em outra época ou elaboradas sem um contexto político ou social em foco. Claro que o ato de compôr não ficou estagnado e atualmente ainda existem muitas manifestações artísticas que levam ao pensamento crítico sobre as vivências e características socioeconômicas de diversos grupos.

    Minha pergunta se refere à atuação do professor em sala de aula. Não parto do pressuposto de que todos os alunos tenham, de fato, uma "audição" aguçada para a percepção de todas as características abordadas em algumas músicas, pois, ainda que haja o suporte de disciplinas relacionadas à linguagem que possam a nivelar os alunos, não podemos ignorar que eles vêm de ambientes únicos e têm experiências únicas (fazendo com que nem todos estejam realmente aptos a interpretar as canções com facilidade).
    Como você acha que o professor, enquanto mediador do conhecimento que usa a música como recurso, deve guiar a aula, nesse sentido?

    Analuz Marinho Gonçalves

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    1. Realmente numa sala de aula temos uma multiplicidade de alunos com bagagens culturais diversas e não teremos uma forma infalível de trabalhar a temática. Sempre teremos que fazer adaptações e algumas vezes até mesmo apresentar algumas de nossas impressões sobre aquela canção para incentivá-los a expor a deles. Creio que o importante é estimular que se expressem, mesmo que a princípio não estejam com audição aguçada ou não estejam acostumados a expor uma interpretação. Se bem pensarmos, a música está bem presente em nosso cotidiano. De maneira informal opinamos, comentamos, pensamos a música, tanto professores quanto alunos. Então acredito que o que falta é nos estimularmos a expressarmos sobre o que sentimos e percebemos ao ouvir uma canção. Acho que aí está um bom começo de trabalho: estimular os alunos a falarem o que percebem numa canção. Obrigado pela pergunta!

      Mateus de Andrade Pacheco

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  4. Uma questão me que interessou no seu texto foi a ênfase na elaboração de pontes entre realidades diferentes (diferentes períodos históricos, diferentes realidades sócio-econômicas, diferentes sensibilidades de escuta). Como você pensa que seria interessante trabalhar em sala de aula essa relação tensa entre continuidades e descontinuidades, entre "nada mudou" e "não é mais assim"?
    Leandro Mendanha e Silva

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    2. Esse realmente é um ponto embaraçoso, pois muitas vezes a maneira como se trabalha continuidade e descontinuidade cria um plano estável, que beira o anacronismo. Acho que o professor deve enfatizar a complexidade dessa operação e perceber que mesmo no solo das continuidades há variações e movências. Tal questão nos coloca diante de uma instabilidade, lugar aparentemente desconfortável, mas que enfatiza que cenários e contextos têm possibilidades diversas. Acho que esse é um caminho viável para quem quer ver na educação um viés transformador, que reelabora realidades sócio-culturais, dá voz a novas identidades. Obrigado pela pergunta, Leandro!

      Mateus de Andrade Pacheco

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    3. Verdade. O que achei mais enriquecedor no seu texto foi a percepção de que a sensibilidade faz essas transposições entre temporalidades e não pode ser descartada da análise ou do ensino. Caso contrário, é bem provável que os alunos não se sintam "engajados" na análise. Ela então seria um exercício estéril que não ajuda o aluno a alargar seus horizontes. Assumi-la na apresentação é um ato arriscado ao mesmo tempo que necessário. Ainda mais necessário, pois os que acham que não são afetados por ela acabam acreditando em uma neutralidade que eles mesmos recusam em outras searas. Acho essa percepção absolutamente fundamental para quem escreve, ensina etc. Parabéns.
      Leandro Mendanha e Silva

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    4. Obrigado, Leandro. Em nosso diálogo acadêmico sabemos que o risco às vezes leva a transformação, inclusive escrever/pesquisar deve ser um ato de transformação. Quando tratamos de temas como a música essa questão da sensibilidade precisa ser levada a sério, pois é matéria da qual a música se alimenta. Imagine tornar a música um solo árido... Acho que o trabalho com a música exige isso e insinua que em outros campos a sensibilidade também precisa ser percebida. Além disso, realmente ela contribui para minarmos certos discursos transvestidos de neutralidade. Obrigado, novamente, pelo comentário. Vamos articulando para melhorar nossos caminhos pelo ofício de historiador.

      Mateus de Andrade Pacheco

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  5. Muito interessante o seu texto! Ao associar a interpretação das canções citadas com a atualidade e com as diferentes interpretações que já existem e que poderão existir sobre a mesma canção, em seu texto você trouxe uma abordagem mais livre e aprofundada sobre a interpretação das canções em sala de aula. Esse tipo de aula é muito comum, mas geralmente se faz uma abordagem engessada no "certo ou errado" ou de forma superficial, somente para introduzir um conteúdo. O intérprete de uma canção faz da sua voz e o do seu corpo instrumentos de construção da narrativa da canção de acordo com a sua visão de mundo e a Elis Regina fazia isso de uma forma brilhante! Diante disso, como trabalhar essas aulas para os alunos dos alunos iniciais do ensino fundamental? Como planejar e realizar as aulas atualmente, tendo em vista o desafio de estar na modalidade EaD?
    Mariana Silva Mancilha

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    2. Mariana, obrigado pela pergunta. Realmente a ideia de aprofundar as interpretações de uma canção em sala de aula, dar mais espaço para que seja analisada e apreciada é uma alternativa para sairmos de certos engessamentos. Uma vez, vendo uma entrevista de Lô Borges, ele disse que seu filho, na época uma criança com 5 anos mais ou menos, opinou sobre suas canções, dizendo que pareciam falar de lugares distantes, que eram uma viagem. A resposta deixou o pai/artista orgulhoso e surpreso. Essa breve história serve de exemplo para o fato de que alunos de variadas idades, inclusive de ensino fundamental, podem nos surpreender com suas interpretações de uma canção e que isso deve ser estimulado. É claro que as vezes precisaremos fazer adaptações, questionar, opinar ou mesmo sugerir caminhos. Na verdade creio que desde cedo temos receio de nos posicionar por receio de estarmos errados. Se conseguirmos desatar esse nó já seria um passo imenso. Em relação a EaD depende muito dos suportes em que ela se dá, se é em tempo real ou aula gravada. Creio que num caso ou noutro, é importante estimular. Eu apostaria em vídeos musicais, que são um suporte com muitos elementos para serem analisados. Ao invés de focar nos resultados, nos sentidos percebidos, creio que é importante apresentar como esses sentidos vão se elaborando, sendo construídos por elementos daquela narrativa. Isso nos coloca diante do processo de elaboração de interpretações, que retira os engessamentos e mostra que a música é porosa, tem detalhes, uns claros para mim, outros para você. Isso traz certo envolvimento, mesmo numa aula gravada, pois mostra a música como algo vivo, pulsante!

      Mateus de Andrade Pacheco

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  6. Olá. Parabéns pelo excelente texto.
    Atuo como professora de História em uma escola de nível fundamental e tenho uma dúvida.
    Ao trabalhar com música em sala de aula me deparo com várias dificuldades, uma delas é o desinteresse da maioria dos alunos em refletir sobre as letras de músicas apresentadas por mim. A preferência dos alunos é por gêneros que estimulam muito mais a movimentação do corpo (principalmente os gêneros funk e forró) tudo que foge disso é automaticamente rejeitado.

    Diante desse problema, quais metodologias poderiam ser empregadas para que os alunos se interessem na leitura crítica das letras de músicas, inclusive aquelas que não são de suas preferências?

    Maria Fabíola da Silva
    email: mariafabioladasilva@yahoo.com.br

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    1. Realmente esse é um fenômeno que acontece e para o qual não temos uma fórmula infalível. Sabemos que as turmas reagem de maneiras distintas às nossas estratégias e vamos adaptando, vendo o que funciona. Uma das possibilidades seria estimulá-los a buscarem canções que abordem o tema proposto em aula. Jogar para a eles o desafio da pesquisa, eis uma possibilidade. Antes de apresentarem a canção em sala, eles devem enviá-la a você para poder se inteirar e pensar a respeito dela, do que pode ser trabalhado, etc. Recomendo que sempre tenha uma canção debaixo da manga para apresentá-la também como uma possibilidade, caso ache necessário. Talvez nessa área de troca, de compartilhamento, eles sejam atiçados também por aquelas canções que não são de sua preferência. Obrigado pela pergunta e pela apreciação do texto.

      Mateus de Andrade Pacheco

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  7. Está muito interessante seu texto. A música abre um leque muito grande de possibilidades para se trabalhar os conteúdos com os alunos, estimulando-os a interagir de uma maneira mais dinâmica com os conteúdos. Porém, temos plena noção que em sala de aula vamos nos deparar com alunos síndrome de down, autistas, surdos, entre outros, minha pergunta é voltada diretamente a questão dos alunos surdos. Como utilizar a música como método de ensino em uma sala de aula onde se tem alunos surdos?

    Paula Andreza Coelho da Cruz

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    1. A expressão musical realmente tem diversas formas de recepção. Trabalhar música com alunos surdos varia também de acordo com os recursos disponíveis para o professor. Acho que um caminho possível é trabalhar com vídeos e a partir daí analisar a performance musical não apenas como som, mas como gesto que se espalha em expressões faciais e corporais. Quando vemos intérpretes como Elis Regina cantando ficamos surpresos em como a música se faz por caminhos diversos, que atravessam variadas expressões. A questão é atentar para esses outros detalhes que também imprimem sentidos e elaboram narrativas juntamente com outros suportes, como iluminação, figurino etc. Atualmente há canais no youtube em que disponibilizam interpretações de canções em libras. Esse é um material que certamente vale a pena usar. Essas são algumas possibilidades, outras podem ser pensadas! Obrigado pela pergunta, ela é estimulante.

      Mateus de Andrade Pacheco

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  8. A música como método de ensino permite aos alunos "dar asas a imaginação", elaborando trabalhos que trazem grande safistação e interesse aos alunos por "sair da rotina" e assim eles buscam pesquisar e se aprofundar nos assuntos. Essa possibilidade permite que os alunos fujam um pouco da realidade, ligando-os ou/e estimulando-os a se conectarem a uma certa utopia. Como estabelecer limites para que os alunos saibam destinguir o utopico da realidade nesse sentido ?

    Paula Andreza Coelho da Cruz

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    1. Acho que o importante é detectarmos o que a "utopia" representa sobre a realidade. Ela pode ser refúgio, negação, contestação, ou seja, ela está conectada ao real, ela se faz a partir dele e, quem sabe, pode modificá-lo. É importante também termos em mente que esse real é significado de diversas maneiras, o que nos coloca diante de uma pluralidade de posicionamentos e visões sobre ele. Obrigado pela pergunta.

      Mateus de Andrade Pacheco

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  9. Você considera que a análise, a interpretação das metáforas em uma música, é possível em um trabalho prévio, antes do aluno conhecer o conteúdo histórico? Obrigada, Adriana Soares Estavarengo estavarengo@uol.com.br

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    1. Sim, esse é um caminho possível. Dá inclusive grande margem para interpretações da canção, além de possibilitar alguma surpresa quando vir à tona a conjuntura em que foi composta e sua ligação com questões daquela época - se for o caso de trabalho com música de outros períodos. Eu acredito que não temos uma receita de como proceder, mas formas plurais de trabalhar o tema. Na verdade, as vezes temos que adaptar, ver como uma turma reage, etc. Certamente essa possibilidade que você coloca é uma ótima escolha, desde que trabalhada com empenho e criatividade, ingredientes importantes em qualquer abordagem, pelo menos para mim. Obrigado pela pergunta!!
      Mateus de Andrade Pacheco

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  10. Belíssimo texto Mateus de Andrade Pacheco, em especial "a mudança de olhar" pelo qual "De pé e altiva Elis encarna a resistência". Sei que as citações que fiz são de momentos distintos do seu texto, mas na minha perspectiva são as que conferem um sentido unificador das suas ideias. Entretanto, como um professor pode estabelecer tais conexões sem parecer anacrônico?
    Álvaro Ribeiro Regiani

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    1. Obrigado pelo comentário, Álvaro. Sua junção de citações capta pontes, essa palavra que diz tanto e que tanto gosto! Eu acho que realmente o risco de cairmos em anacronismos é enorme. Creio que é importante frisar em sala de aula as diferenças de cenários, mesmo quando mostramos linhas de continuidade.

      Mateus de Andrade Pacheco

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    2. Muito obrigado por me esclarecer!

      Abraços

      Álvaro Ribeiro Regiani

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  11. Um texto lindo, Mateus! Excelente sua exposição do uso do discurso musicado e dos sons. Você teria sugestões sobre estratégias para a incorporação de debates sobre a cena musical e a indústria cultural nas aulas de história ?

    Kenia Gusmão Medeiros

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    1. Kenia, esse é um tema bem interessante, embora me pareça ainda pouco abordado, muitas vezes até mesmo pelas dificuldades que impõe. Creio que uma possibilidade seria partir dos agentes de produção de uma canção, mostrando que ela faz um percurso até chegar ao público, que vai do seu processo de feitura - as condições de produção de uma canção - até os meios de distribuição e divulgação. Evidentemente isso ganha cores distintas dependendo da época em que a música foi gravada e isso deve ser trabalhado. Esse percurso parece um tanto complicado, mas pode ficar mais claro se partirmos da experiência musical dos alunos, questionando sobre como as músicas chegam até eles, por que algumas que eles ouvem não estão na TV e no rádio, etc. Por essa via torna-se possível introduzir questões mais complexas que ajudam a entender a cena musical e sua relação com a indústria cultural. A partir disso é interessante que o professor recorra a uma boa bibliografia de apoio sobre a temática, algo mais acessível, mas de boa qualidade. Nesse sentido, eu sugeriria o trabalho de Marcia Tosta Dias, que muito contribui para pensarmos nessa questão. Obrigado pela pergunta, ela nos leva para uma reflexão que precisamos mesmo encarar.

      Mateus de Andrade Pacheco

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    2. Obrigada de novo, Mateus. São orientações valiosas!

      Kenia Gusmão Medeiros.

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    3. Obrigado Kenia!

      Mateus de Andrade Pacheco

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  12. Olá Mateus, gostaria de parabenizá-lo pelo excelente trabalho. Sou acadêmica do curso de História da Universidade Estadual do Paraná e em minha experiência em sala de aula com o estágio utilizo a música como metodologia de ensino-aprendizagem. Para além das análises das músicas você acredita que a utilização de paródias pode contribuir com o interesse dos estudantes nas aulas ?

    Izabela de Paula Gomes

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    1. Obrigado Izabela, pela leitura e pela pergunta. Gostei muito da ideia. Eu creio que a paródia seja um ótimo recurso, pois envolve o aluno num processo de confecção que possibilita inclusive refletir sobre linguagens e sobre os recursos do discurso musical. O aluno assim faz da canção uma espécie de laboratório que diz muito sobre o fazer poético-musical e ainda possibilita o trabalho com alguns conteúdos de maneira criativa e estimulante.

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  13. Mateus de Andrade, parabéns pela abordagem quase poética da temática. Aprecio muito suas escutas musicais, pesquisas e escritas acadêmicas. Quando você cita, logo nas primeiras linhas: “Música é partilha, convite a estar junto” me faz lembrar da transfiguração do político abordada por Michel Maffesoli, em que o político está na comunhão, na partilha de sentimentos, de emoções. Pensando por essa perspectiva podemos entender a música como um artefato sociocultural que possibilita sentidos plurais. Me são caros os termos “apropriação”, pluralidade, porque contribuem com propostas de análises mais abertas, como você pontua muito bem em seu texto. Como você analisa as relações de continuidade e descontinuidade nesse contexto de polarização atual? Que sugestões e alertas você daria para não cairmos no lugar comum diante desse cenário?

    Leidiane Lopes de Souza

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    1. Leidiane, obrigado pela pergunta e também pelo comentário atento e pertinente. Um dos grandes problemas atuais é a falta de abertura para o diálogo presente em muitas esferas de nosso cotidiano. Realmente é uma dificuldade até mesmo abordar certos temas. Parece que precisamos de calma e paciência para continuar fazendo as coisas da maneira que acreditamos que precisam ser feitas. Pensando nisso, creio que nessa relação continuidade/descontinuidade, precisamos nos abastecer de uma reflexão em que sobressaia a ideia de que essa operação se dá de forma complexa, passa por adaptações a novas demandas, às possibilidades da atualidade, ou seja, mesmo quando tudo parece igual não está totalmente igual. Isso é importante para evitarmos certos paralelismos que levam ao anacronismo. Acredito que o trabalho com as relações de continuidade e descontinuidades nos coloca diante da movência, das ressignificações, ponto que contribui para darmos lugar à diversidade cultural e comportamental.

      Mateus de Andrade Pacheco

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    4. Sim, é um grande desafio, e como você bem pontuou, diário. Concordo com suas análises, o movimento está no descontínuo, naquilo que nos escapa e é isso que tem nos interessado, cada vez mais, no campo de uma História cultural. Buscar construir um conhecimento voltado para a diversidade, para o que é plural. Pensando dessa forma, a música torna-se uma excelente e prazerosa forma de continuarmos no caminho em que acreditamos,

      Obrigada pela resposta!

      Leidiane Lopes de Souza

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    5. Sim, Leidiane. Inclusive há muitas vertentes musicais para descobrirmos, não é mesmo? A música é um lugar de fala de muitos segmentos, inclusive na atualidade. E ela traz um envolvimento que gera entusiasmo. É um campo com uma diversidade enorme de possibilidades. O que apresentamos é apenas uma amostra de tudo que pode ser feito.

      Mateus de Andrade Pacheco

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    6. Sim, entendi e gostei muito da proposta. Já pensou em futuros trabalhos direcionados ao Ensino de História, em que você, com sua experiência acadêmica, pudesse dar orientações a professores e professoras de como seria possível trabalhar essas ideias na prática? Acredito que seria de grande contribuição ao ensino e aos profissionais.
      Mais uma vez, parabéns pelo texto e obrigada pela resposta.

      Leidiane Lopes de Souza.

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    7. Essa é uma bela ideia que podemos pensar numa forma de viabilizar! Obrigado pelo comentário!
      Mateus de Andrade Pacheco

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  14. Ótimo trabalho professor.
    Levanto o questionamento sobre o cenário atual da música, que os artista estão apenas preocupados em vender e que grande parte desses ouvintes são jovens. No texto têm exemplos de músicas clássicas que foram escrita e interpretadas em momentos importantes da história, para que os alunos consiga fazer análise e reflexão sobre essas canções, em que momento o professor deveria inserir essa metodologia em sala de aula?

    Juan Pimentel da Silva, aluno de graduação de Licenciatura Plena Em História da Universidade Nilton Lins, Manaus, Amazonas.

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    1. Bom dia, Juan, obrigado pela pergunta. Creio que a questão principal da atualidade, em relação a produção musical, é a divulgação dos trabalhos. Há muitos artistas fazendo um excelente trabalho. Se pegarmos dentro do segmento da MPB, por exemplo, temos Simone Guimarães, Badi Assad, Ceumar, Renato Braz, Caio Prado, Luejdi Luna e tantos outros. Alguns desses artistas até conseguem chegar a um público maior, mas quase todos estão em meios alternativos e suas canções chegam a um público mais específico, que vai atrás de suas obras. Em relação ao momento ideal de trabalhar com clássicos da MPB, creio que isso pode acontecer a qualquer momento, mesmo que cause algum estranhamento no princípio. Na verdade, eu acredito que isso depende muito de quando você se sente a vontade para trabalhar com essas canções, de sua interação com a turma, etc. A decisão passa por essas subjetividades.

      Mateus de Andrade Pacheco

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