O INDIVÍDUO E A
NOVA HISTÓRIA: REFLEXÕES SOBRE O MODELO BIOGRÁFICO NA HISTORIOGRAFIA
Introdução
Há
algo de intrigante no ofício do historiador. A busca incessante pela veracidade
histórica lhe possibilita ver o mundo com outros olhos, com olhos de inquieta e
admirável observação sobre o passado. Antes de mais nada, é necessário
reconhecer que esse olhar em direção ao passado ocorre a partir de intensas
observações e questionamentos que partem e resultam das relações desencadeadas
no presente. Tais questionamentos e percepções de mundo, aliados a teorias
fundamentadas pela conexão com a realidade vivida, possibilitam aos historiadores
adentrar no mundo das narrativas e a partir dele apontar caminhos e rascunhar
interpretações para a compreensão do passado através da produção de novas
alternativas historiográficas.
Se
há no historiador-pesquisador uma inquietação sobre o fazer história, se há
para ele uma indagação sobre a teoria na qual poderá se apoiar na busca pela
compreensão desses passados, é preciso também considerar que a forma como vai
representar esse passado, no presente, se coloca como questão de primeira
ordem. Não se pode, por exemplo, considerar um exaustivo levantamento
bibliográfico, um arcabouço metodológico e nem uma busca cansativa pelas fontes
aliadas à reflexões profundas sobre a construção das memórias nelas impressas,
sem o domínio dos meios necessários para apresentar, através da escrita, o
resultado de uma pesquisa. Se a proposta de uma história escrita se apresenta
como a forma legítima de registrar os fatos históricos, o
historiador-pesquisador deve, por ofício, dominar os mecanismos de escrita que lhe
possibilite desenvolver suas narrativas.
No
interior do movimento dos Annales,
por exemplo, houve uma intensa busca por novas formas de se pensar e escrever a
história. Seus mais influentes membros contribuíram de forma significativa para
a renovação da historiografia. O diálogo interdisciplinar e a apropriação de
conceitos de outros campos disciplinares, aliados à crítica sobre as fontes e o
reconhecimento da subjetividade de quem escreve, possibilitaram o surgimento de
novas problemáticas. A crítica ao modelo positivista que enfatizava uma
narrativa “literal” dos acontecimentos, registrados em documentos oficiais,
assim como a crítica sobre a noção de “neutralidade” do pesquisador e ao modelo
de narrativa que exaltava indivíduos tidos como excepcionais, foi e ainda hoje
permanece uma constante nesse movimento.
Mesmo
apesar das inúmeras críticas em direção ao positivismo do século XIX, parecia
que se poderia salvar alguma coisa daquela tradição. Não se abriu mão dos
documentos escritos, mas passou-se a lançar sobre eles um olhar crítico como se
o questionador almejasse dialogar com as fontes disponíveis, esperando
respostas para as omissões das ações mais significativas do individual e da
coletividade. Também se ampliou a noção de fontes históricas. Não houve
repressão à ideia de neutralidade do historiador (Já que esta nunca existiu!),
mas o reconhecimento da interferência do sujeito na escrita da História.
Assim
como os documentos escritos, outro elemento apropriado foi o modelo narrativo
biográfico. Este não foi excluído do leque de possibilidades inovadoras e teve
seu lugar preservado como modelo de escrita da história. Por outro lado, foram
necessárias uma série de transformações metodológicas que permitissem o
enquadramento desse modelo de narrativa nas pretensões do movimento dos Annales. Algumas dessas transformações
no modo de escrever biografias serão elencadas ao longo deste texto. Dentre
elas, a interdependência entre indivíduo e sociedade merece destaque.
Os
membros mais conhecidos dos Annales
escreveram biografias e demonstraram que a partir de uma trajetória individual
seria possível desenhar um cenário que representasse o “espírito de uma época”. Dentre alguns trabalhos podemos citar: 1.
Os reis taumaturgos: o caráter sobrenatural do poder régio, França e
Inglaterra, de Marc Bloch ([1924] 1993); 2. Martinho Lutero: um destino, de Lucien Febvre ([1928] 2012); 3. Guilherme Marechal ou o melhor cavaleiro do
mundo, escrito por Georges Duby (1987);
4. Carlos V e Felipe II in Reflexões sobre a História, de Fernand
Braudel ([1992] 2002) e 5. São Luís: biografia, de Jacques Le Goff
([1996] 1999). Apesar das perspectivas que diferenciam os trabalhos de cada
historiador citado (religiosidade, política, geografia, economia e cultura), o
foco destas narrativas biográficas é o indivíduo e a relação que estabeleceram
com a sociedade em que vive.
De
acordo com historiadores que consideram a biografia uma abordagem promissora,
através da inter-relação indivíduo-sociedade, tal abordagem possibilita
uma aproximação entre o tempo presente e passados longínquos, traçando perfis
de sociedades a partir de “trajetórias individuais” nas quais os biografados
estiveram inseridos. Apesar das críticas que vem sofrendo por parte de alguns
historiadores contemporâneos – que acreditam ser a escrita biográfica um
retorno desnecessário a velhas temáticas – o gênero biográfico têm demonstrado
ser uma proposta interessante de escrita que proporciona aos leitores uma visão
menos superficial sobre as trajetórias de vida de indivíduos de uma determinada
época e da conjuntura da qual fizeram ou fazem parte.
Conforme
demonstraremos mais adiante, as propostas de biografia historiográfica visam, a
partir do indivíduo, apresentar aspectos estruturais e conjunturais da
sociedade que o cerca, estando repleta de costumes, símbolos e discursos
fundamentados em estruturas políticas, econômicas e religiosas. Essas
estruturas impactam direta ou indiretamente no indivíduo e na própria
sociedade. Nesse sentido, a proposta deste texto é apresentar breves
considerações sobre a utilização das biografias como proposta de narrativa
historiográfica.
A
biografia: um discurso historiográfico?
Muito
já se discutiu sobre a escrita da História, sobre a fórmula que melhor se
adapta ao rigor metodológico buscado pelos historiadores na tentativa de
apresentar uma maior qualidade científica nos resultados de suas pesquisas e,
ao mesmo tempo, possibilitar aos leitores a recepção de suas mensagens. Aqui
também se deve considerar os caminhos e razões da escrita historiográfica: se
queremos alcançar os objetivos da História como uma área de conhecimento que se
propõe a pensar o passado a partir do presente e identificar aspectos que nos
possibilite compreender nossa própria realidade, precisamos flexibilizar os limites
impostos pela escrita acadêmica e o mundo intelectual. O discurso
historiográfico precisa se renovar e, para tanto, inovar em suas possibilidades
de narrativa sem negligenciar o rigor metodológico de suas análises, ainda que
para isso, precise acionar modelos de escrita considerados, por alguns como
ultrapassados.
Com
certeza, essa não é uma discussão nova. Mas, o que se propõe aqui é uma
reflexão em torno de como desenvolver uma narrativa biográfica que permita a
manutenção do rigor acadêmico e dos modelos de escrita; de modelos que
possibilitem a clareza das ideias apresentadas pelos historiadores a partir de
suas representações sobre o passado. Por isso se faz necessária uma reflexão
sobre a escrita da história no espaço acadêmico e suas formas de representação
do passado e compreensão do tempo presente.
Apesar
de ser criticada pela ênfase que dá ao indivíduo e de seu papel de destaque na
narrativa, o modelo biográfico tem suas pretensões à legitimidade histórica.
Cabe aqui a observação de que o modelo apresentado pelo Nova História
não se confunde com um retorno ao modelo de biografia
tradicional, mas se caracteriza como proposta que se baseia em metodologias
de pesquisa que possibilitem a renovação da forma de se escrever biografias.
No
modelo de biografia clássica se pressupõe que a trajetória de vida de um
indivíduo, de preferência de uma pessoa ilustre, pode representar todo o
espírito de uma época e ser considerado como modelo de estilos de vida de
determinada época e sociedade. Na biografia tradicional as análises em
torno das ações dos grandes homens os colocam no epicentro da narrativa o que
acaba por ofuscar a complexidade das relações de interdependência entre os
indivíduos e os meios que os cercam.
Nas
análises desenvolvidas por Eliane Misiak (2012), no trabalho intitulado O
retorno do indivíduo como objeto da história: reflexões à luz da teoria
semiótica, existe uma diferenciação dessas abordagens, donde a biografia
tradicional pode ser considerada a partir de processos de fechamento
e triagem, tendo como suas figuras o distinto e o absoluto. Já o modelo proposto pela
Nova História, especialmente a partir dos anos 1970, se caracteriza pela seleção
e combinação de elementos de abertura e de mistura, tendo
como inovação a figura do comum e do disparatado. Nas palavras de
Misiak (2012, p. 64):
“Retornando
às grandezas enuncivas presentes no discurso biográfico histórico, tem-se que,
de modo geral, os termos que marcam a oposição entre os dois modelos são, para
a biografia tradicional, “o grande homem”, “o homem distinto”, “o conhecido”,
enquanto que para a biografia que caracteriza parte da produção a partir dos
anos 1970, resultante dos questionamentos epistemológicos que marcaram o
período, aparecem como figuras “o homem qualquer”, “o homem ordinário”, “o
desconhecido”, “o marginal”.
Por
outro lado, devemos reconhecer que a escrita biográfica tem suas fragilidades.
Por isso muitos teóricos da historiografia atual têm criticado esse modelo de
escrita. Pois, nos últimos anos, tem crescido o debate sobre os modelos
próprios da narrativa. A polêmica dessas discussões vem à tona principalmente
quando os debates giram em torno das diferenças e semelhanças entre a narrativa
historiográfica e a narrativa literária. Exemplos de intensos debates sobre a
narrativa literária e a narrativa histórica bem como as concepções de veracidade
e verossimilhança histórica podem ser evidenciados nos trabalhos
desenvolvidos pelo historiador estadunidense Hayden White e o historiador
italiano Carlo Ginzburg. O primeiro tem lançado duras críticas sobre a escrita
da História e sua complexidade considerando a escrita literária como uma
possibilidade de saber histórico. O segundo se empenha em refletir sobre os
caminhos e metodologias que legitimam o fazer história através de uma escrita
fundamentada no rigor da análise das fontes. Para uma reflexão inicial sobre
suas discussões, conferir o artigo de Hayden White intitulado Enredo e
verdade na escrita da história, bem como o artigo de Carlo Ginzburg
intitulado O extermínio dos judeus e o princípio da realidade, ambos
publicados na coletânea organizada por Jurandir Malerba (2006), intitulada A
História Escrita: teoria e história da historiografia.
Apesar
das fragilidades, o modelo biográfico de narrativa acaba por se destacar nesses
debates justamente por transitar entre História e Literatura. Para muitos
historiadores é inquietante observar que o público leitor, ao se deparar com um
livro de História e outro de Literatura opte, na maioria das vezes, pela obra
literária. Vale aqui a ressalva de que não é nossa intenção diminuir a
importância da narrativa literária, mas apenas observar que, apesar das
semelhanças, existem algumas diferenças entre esta e a narrativa
historiográfica, principalmente no que diz respeito ao trato com as fontes
históricas. Por outro lado, é preciso reconhecer o papel da literatura na
construção de discursos e memórias passíveis de verossimilhança histórica com
determinadas épocas. Enfim, há de se considerar também a importância de muitas
obras literárias, de cunho político, as quais se apresentam como uma espécie de
crítica moral à sociedade e que, por isso, são legítimas na construção dos
modos de pensar criticamente o meio social.
Exemplo disso são os vários
manuscritos que circularam em Minas Gerais no ano de 1785 conhecidos como Cartas
Chilenas e que foram atribuídos, em 1940, a Tomás Antônio Gonzaga, jurista,
poeta, ativista político e partícipe da Conjuração Mineira, em 1789. De acordo
com Márcia Abreu (2011, p. 131), as Cartas Chilenas:
“[…] inserem-se numa tradição de
crítica às autoridades por meio de manuscritos anônimos […]. Criando o
artifício de uma troca de cartas entre Critilo e Doroteu, são compostas
epístolas em versos brancos, que tomam por alvo o governador de Minas, Luís da
Cunha Menezes, aludido no poema, sob a roupagem do Fanfarrão Minésio, fictício
governador do Chile sob o domínio colonial espanhol.”
Tomando
este exemplo, podemos considerar que certas escritas biográficas, ainda que de
cunho literário, são narrativas que podem ser utilizadas como modelos geradores
de reflexões sobre determinados contextos históricos. Conforme observou
Alexandre de Sá Avelar (2010, p. 161), “[...] a biografia provoca um polêmico
questionamento à absoluta distinção entre um gênero verdadeiramente literário e
uma dimensão puramente científica, suscitando tanto as tensões como as
convivências existentes entre literatura e Ciências Humanas”. Dessa forma, é
preciso considerar que a biografia tem sido importante veículo de comunicação
sobre uma época na medida que estabelece relações entre o indivíduo e a
sociedade do qual faz parte. Nesse ponto, tanto a Literatura quanto a História
têm produzido importantes contribuições biográficas.
Caminhos
da biografia: entre o indivíduo e a sociedade
Para
Avelar (2010, p. 159), o movimento dos Annales
delimitou, através de uma perspectiva totalizante a escrita biográfica a
partir de dois modelos: a biografia representativa e o estudo de
casos. No primeiro modelo, o indivíduo não seria destacado por aquilo que
teria de individual e autêntico, mas pela habilidade de representar outras
vidas e modos através da sua própria, “por servir de passagem para a apreensão
de marcos mais amplos”. No segundo modelo, a biografia dá ênfase às trajetórias
individuais sem deixar de analisar as estruturas e as conjunturas. O indivíduo
reflete a moral e os costumes de uma época. Observa-se que nos dois modelos
biográficos indivíduo e sociedade são partes que compõem o social. Apesar da
ênfase sobre cada abordagem, não se exime a importância do ser e da sociedade
como elementos sobrepostos na construção da narrativa biográfica informada pela
historiografia dos Annales.
Conforme
observou Carlos Antonio Aguirre Rojas (2003, p. 10), oscilando nas análises que
evidenciam o indivíduo, o contexto de sua época e o meio no qual se relaciona
com outros indivíduos “o gênero biográfico sofreu, bem como a história e a
historiografia em seu conjunto, os impactos das grandes viradas históricas”. E
essas viradas tiveram êxito significativo no que diz respeito ao lugar do
indivíduo na sociedade e dos aspectos sociais nas trajetórias individuais,
principalmente a partir do desenvolvimento da noção de indivíduo que tomou
forma no período moderno. É, portanto, nesse sentido que devemos considerar a
análise das conjunturas como aspecto fundamental para a escrita de um trabalho
biográfico. É também por conta da individualização do ser, sem esquecer-se da
perspectiva totalizante – aspecto evidenciado nos modos de pensar a história na
perspectiva da Escola do Annales – que
o modelo biográfico como proposta de narrativa histórica deve ser reconhecido
como um dos modos estratégicos de escrita da Nova História.
No
entanto, a narrativa biográfica histórica não está isenta de fragilidades e,
por isso, críticas epistemológicas são lançadas em sua direção. Para Avelar
(2010, p. 161), “o campo da escrita biográfica é certamente um palco
privilegiado de experimentação para o historiador, que pode avaliar o caráter
ambivalente da epistemologia do seu ofício, inevitavelmente tenso entre seu
polo científico e seu polo ficcional”. Para Aguirre Rojas (2003, p. 8), a
complexidade desse modelo de escrita é uma realidade desde o seu surgimento
“nos tempos remotos da antiga Grécia, quando a biografia é concebida como algo
essencialmente diferente da história”. Entende ainda que, fundamentalmente, o
problema básico e geral não só desse modelo de escrita, mas de toda concepção
histórica possível, ainda seria a “complexa relação entre o indivíduo e a
sociedade”.
Para
ampliar o alcance das metodologias de análise e aproximar a narrativa da
veracidade histórica é preciso saber localizar o indivíduo e detectar a sua
relação com a sociedade em que vive, pois há, na escrita biográfica, o perigo
levar o leitor a crer que o indivíduo destacado representa, genericamente, os
modos de pensar, perceber e agir na sociedade. Assim, quando não se tem o
cuidado de esclarecer a complexidade do meio e da relação do indivíduo com
este, a biografia pode acabar fomentando a ideia de que aspectos generalizantes
podem refletir costumes e representações sociais de uma época. Além disso, não
se pode considerar a sociedade sem fazer conexões entre as ações individuais e
coletivas nela existentes. enfim, se faz necessário identificar
particularidades sem negligenciar dimensões generalizantes que podem esvaziar a
narrativa biográfica.
O
cuidado com a escrita biográfica, no que diz respeito a não enfatizar o
individual em detrimento do meio e vice-versa, serve para evitar que a ênfase
na parcialidade seja tomada como regra. Nesses termos, o indivíduo deve ser tomado
como um caminho para se chegar ao todo e as estruturas e conjunturas como
ferramentas para a compreensão dos acontecimentos e das ações humanas. O
indivíduo deve ser percebido através de sua agência, mas também através de sua
passividade frente a forças maiores e acontecimentos significativos de sua
época. Aqui também se deve estar atento às mudanças ocorridas paralelamente às
trajetórias individuais e, a partir disso, perceber as mudanças na trajetória
do indivíduo. Conforme observou Aguirre Rojas (2003, p. 8):
“[...]
assumir como historiador o tema da biografia de determinado personagem é
aproximar-se da reconstrução global dessa complexa tensão que, na dialética
progressiva/regressiva das diversas “escolhas” do personagem histórico,
desdobradas dentro do particular “campo dos possíveis” estabelecido por sua
época e seu meio, terminam por definir a singularidade das condições e o
itinerário do “projeto” desse mesmo personagem, mas igualmente o impacto real e
as consequências concretas desse mesmo projeto sobre o referido contexto de
época e do meio correspondente”.
Considerações
pontuais
Conforme
observado, a construção de uma narrativa biográfica que forneça um rigor
científico e uma aproximação com o fato histórico requer uma busca incessante
pela compreensão do todo. Mas é preciso considerar que não há solução clara
quanto aos problemas da narrativa, seja ela historiográfica ou literária,
biográfica ou não. Cabe ao historiador-pesquisador aliar suas reflexões sobre o
objeto às fontes que lhe permitam fundamentar suas hipóteses, evitando sempre
que possível incorrer em generalizações e/ou simplificações. Enfim, os indícios
nos permitem considerar que, apesar da alcunha de abordagem tradicional, o
modelo biográfico, considerando novas perspectivas de análise, pode se
constituir em importante ferramenta de produção historiográfica na medida em
que privilegia a relação estabelecida entre os indivíduos e as sociedades da
qual fazem parte.
Referências
Fernando
Roque Fernandes é Professor de História Regional do Brasil pela Universidade
Federal de Rondônia (UNIR) e doutorando do Programa de Pós-graduação em
História Social da Amazônia pela Universidade Federal do Pará (UFPA).
Lattes: http://lattes.cnpq.br/1923237260647754.
ABREU,
Marcia Azevedo. As memórias do outro – debate do texto “O passado no presente.
Ficção, história e memória”. In CASTRO ROCHA, João Cezar de (Org.). Roger
Chartier – a força das representações: história e ficção. Chapecó, SC; Argos,
2011.
BLOCH,
Marc Leopold Benjamin. Os reis taumaturgos: o caráter sobrenatural do poder
régio, França e Inglaterra. Companhia das Letras, 1993.
AGUIRRE
ROJAS, Carlos Antonio. Braudel, o mundo e o Brasil. Tradução de Sandra Trabucco
Valenzuela - São Paulo: Cortez, 2003.
AVELAR,
Alexandre de Sá. A biografia como escrita da História: possibilidades, limites,
tensões. Dimensões. Revista de História da Ufes. Dossiê: Formas da História,
sentidos da historiografia. Nº 24; 2010, p. 157-172. Disponível em:
http://periodicos.ufes.br/dimensoes/issue/view/221.
BRAUDEL,
Fernand. Reflexões sobre a História. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
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Georges. Guilherme Marechal ou o melhor cavaleiro do mundo. Rio de Janeiro:
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FEBVRE,
Lucien. Marinho Lutero: um destino. São Paulo: Três Estrelas, 2012.
LE
GOFF, Jacques. São Luís. Biografia. Rio de Janeiro: Record, 1999.
MALERBA,
Jurandir (Org.). A história escrita: teoria e história da historiografia. São
Paulo; Contexto, 2006.
MISIAK,
Eliane. O retorno do indivíduo como objeto da história: reflexões à luz da
teoria semiótica. História da Historiografia: International Journal of
Theory and History of Historiography, v. 5, n. 9, p. 57-71, 23 jun. 2012. Disponível em:
https://www.historiadahistoriografia.com.br/revista/article/view/403;
Acesso em: 27 mar. 2020.
Prezado autor,
ResponderExcluirTalvez você tenha discutido essa minha dúvida no texto, mas eu não consegui assimilar bem. Em que se perde uma biografia que é feita muito anos após a morte do indivíduo a ser biografado, no sentido em que o autor não viveu a época e não teve o esforço de fazer um levantamento histórico do determinado contexto, ou mesmo não teve essa percepção? Quais elementos de rigor acadêmico que não estejam presentes nessas biografia podem empobrecer e descredibilizar tal escrita como uma fonte confiável e mais próximo de uma verdade, que possa ser usada como fonte histórica?
Teria um descredito nessa fonte, na perspectiva de autores que não são historiadores, caiam em vícios que são abominados pela história, como criar uma narrativa que favoreça a pessoa ilustre a ser biografada, na medida que o autor possa deixar de lado os atos falhos desse individuo, e privilegiar apenas grandes feitos dele, tal como também privilegiar uma narrativa que só destaque as elites da qual faziam parte e não se discuta a como era o cotidiano dos menos favorecidos? Como desviar dessas narrativas sem rigor historiográfico?
Lucas Pereira de Moraes
Caro Lucas Pereira, saudações cordiais!
ExcluirPrimeiramente, agradeço pela leitura desta breve contribuição. Em seguida, agradeço pelos questionamentos levantados.
Nesse sentido, tentarei responder por partes...
1. A primeira questão que devemos levar em consideração, no que diz respeito ao texto apresentado, é que mais do que privilegiar os elementos relacionados à biografia feita sobre um determinado sujeito, devemos verificar como certas biografias podem trazer à tona informações que dizem muito mais respeito à sociedade e o momento em que o sujeito biografado viveu do que propriamente a trajetória individual do sujeito. Nesse sentido, é importante considerar que apesar da biografia ser um método de narrativa historiográfica que toma o indivíduo como protagonista, seu uso se diferencia a depender da perspectiva historiográfica que a produz. Por exemplo, se a historiografia tida como "Tradicional" propõe um modelo de narrativa biográfica que privilegia sujeitos considerados excepcionais capazes de modificar os rumos da sociedade em que vive ou viveu, a narrativa biográfica apropriada pelas novas abordagens historiográficas, mesmo entendendo determinado sujeito como elemento importante, está mais preocupada em refletir sobre a sociedade em que o sujeito está inserido, ou seja, as abordagens desenvolvidas pela Nova História, especialmente francesa e italiana, parte do sujeito para a compreensão da sociedade, entendendo-o como parte dela. Já para as abordagens tradicionais, as narrativas onde sujeitos são os protagonistas privilegia as ações individuais em detrimento das estruturas sociais, políticas, econômicas e culturais das quais é dependente;
2. Quando falamos das perdas e fragilidades no processo de biografar determinado sujeito partícipe de outro espaço temporal, a situação é muito semelhante ao que pode ocorrer com uma situação em que se biográfica um sujeito contemporâneo ao historiador. Sempre haverá perdas! Nesse sentido, acredito que o ponto importante aqui é a habilidade e cuidado que deve ter o historiador em basear a biografia a ser desenvolvida nas fontes acessíveis. Esse é o elemento importante de uma abordagem historiográfica: ela sempre deverá se basear em fontes. E isso ocorre, justamente, porque independente do sujeito ou recorte temporal, sempre haverá perdas. Já no que diz respeito à situação em que o historiador não viveu ou vive no mesmo recorte espacial do biografado é preciso ter mais atenção ainda para não cair em armadilhas anacronistas. Ou seja, entender o contexto social do biografado tomando como base o contexto social daquele que produz a biografia;
3. No que diz respeito à credibilidade da biografia, a única saída para se evitar o empobrecimento da narrativa é se basear, sempre, nas fontes acessíveis. Pois, toda afirmação que não está baseada em fonte é passível de crítica e representa fragilidades na análise. As fontes devem fundamentar a narrativa. Enfim, mesmo baseada em métodos, conceitos e dados, considero que toda verdade científica é parcial. Nesse sentido, o máximo que qualquer estudo historiográfico pode alcançar é uma espécie de verossimilhança com o objeto pesquisado;
4. Sobre a questão de autores que não são historiadores, não há muito a ser dito: Independente de ser historiador ou não, é preciso se utilizar dos métodos de pesquisa historiográfica, caso contrário, a narrativa não é historiográfica;
5. Enfim, existem vários tipos de biografia. Elas podem se forte abraço!
Fernando Roque Fernandes
Universidade Federal de Rondônia (UNIR).undamentar numa perspectiva tradicional ou não. Elas podem ser encomendadas. Podem ser parcializadas. Podem ser desenvolvidas com o intuito de privilegiar ou desmerecer o sujeito biografado. Dessa forma, antes de fomentar qualquer julgamento sobre uma biografia se faz necessário problematizá-la com base nos critérios historiográficos.
Espero ter respondido minimamente suas indagações.
Forte abraço!
Fernando Roque Fernandes
Universidade Federal de Rondônia (UNIR).
Caro Lucas, houve um erro de digitação no final da mensagem. Nesse sentido, a partir do item 5, leia da seguinte forma:
Excluir5. Enfim, existem vários tipos de biografia. Elas podem se fundamentar numa perspectiva tradicional ou não. Elas podem ser encomendadas. Podem ser parcializadas. Podem ser desenvolvidas com o intuito de privilegiar ou desmerecer o sujeito biografado. Dessa forma, antes de fomentar qualquer julgamento sobre uma biografia se faz necessário problematizá-la com base nos critérios historiográficos, verificando os elementos de sua produção.
Espero ter respondido minimamente suas indagações.
Forte abraço!
Fernando Roque Fernandes
Universidade Federal de Rondônia (UNIR)
O que o pesquisador deve ter em mente antes de fazer uso de uma biografia como fonte histórica? Quais principais elementos que obrigatoriamente o pesquisador-historiador deve analisar para que uma biografia possa ser considerada de caráter científico que sirva como uma fonte histórica para se entender uma determinada conjuntura, análise e aproximar a narrativa da veracidade histórica? Qual o método para evitar erros que possam por em descrédito a fonte biográfica?
ResponderExcluirLucas Pereira de Moraes
Caro Lucas Pereira, agradeço mais uma vez pela contribuição! Dessa forma, seguem algumas reflexões:
Excluir1. Uma das coisas que considero muito interessantes no âmbito da historiografia é o processo de aperfeiçoamento do pesquisa que, à medida em que vai se familiarizando com as metodologias de análise, desenvolve a habilidade de identificar quando uma determinada bibliografia pode ser utilizada como parâmetro para fundamentar suas afirmações e quando ela pode ser utilizada como uma fonte histórica. Nesse sentido, considero que toda bibliografia, inclusive as biografias, podem ser utilizadas como parâmetro e/ou como fonte. O segredo dessa reflexão é o processo de problematização que envolve as metodologias de análise historiográfica. Nesse sentido, acredito que antes de se utilizar de uma determinada biografia como fonte histórica, o pesquisador deve ter clareza sobre os objetivos da pesquisa que está desenvolvendo;
2. Obrigatoriamente, o pesquisador historiador deve ter clareza onde quer chegar e os limites que estabelece para se manter focado no alcance dos objetivos propostos inicialmente ou aperfeiçoados ao longo da pesquisa. Nesse sentido, independente de qualquer questão referente ao cientificismo ou não de uma biografia devemos ter coerência no alinhamento entre a questão proposta e os objetivos a serem alcançados com a biografia;
3. É importante termos em mente que, independente do fato de uma biografia ser considerada tradicional, não há fundamento para desconsiderá-la como historiográfica. A diferença que separa uma abordagem tradicional e aquela baseada na tradição dos Analles são os métodos utilizados para o desenvolvimento destas narrativas e os objetivos segundo os quais elas foram criadas. Ou seja, quem considera as abordagens tradicionais ultrapassadas são aqueles que defendem novas abordagens. mas isto não significa que por ser tradicional ela seja não-histórica. Sei que sua questão não enveredou por este caminho, mas é importante que tenhamos clareza sobre esta questão tão negligenciada em nosso cotidiano acadêmico;
4. Na escrita da História quanto maior for a quantidade e tipos de fontes com as quais estabelecermos relações para fundamentar nossas narrativas, menos será a possibilidade de afirmarmos coisas sem saber do que estamos falando. Ou seja, o segredo da veracidade histórica está na interrelação que estabelecemos com o maior número de fontes sobre determinada questão
Mais uma vez, agradeço pele leitura atenta deste texto e pelas considerações apresentadas.
Forte abraço!
Fernando Roque Fernandes
Universidade Federal de Rondônia (UNIR)
Olá Fernando, em relação a biografia no contexto historiográfico penso que a obra sobre a trajetória de alguém poderá omitir fatos assim como as fontes oficiais, uma vez que, se é escrito sobre sua vida aquilo que lhe convém? O que você acha?
ResponderExcluirLidiane Álvares Mendes
Cara Lidiane Álvares, saudações cordiais!
ExcluirAgradeço pela contribuição. Seguem algumas reflexões sobre a questão colocada:
1. Concordo absolutamente com você. Alias, para além da biografia, considero que qualquer abordagem desenvolvida historiograficamente tem suas lacunas e não consegue dar conta da apresentação de todos os fatos ocorridos.
2. Precisamos, enquanto historiadores, ter clareza de que mesmo as abordagens historiográficas, desenvolvidas com base na utilização de fontes, metodologias de levantamento e análise, utilização de conceitos teóricos e o estabelecimento de diálogos com outras ciências não é suficiente para representar o fato tal qual ele ocorreu.
3. Quando você menciona sobre a conveniência de quem é biografado, se refere a apenas uma das abordagens biográficas. Especificamente àquela que é desenvolvida com interesses particulares e pode acabar, na maioria dos casos, favorecendo o biografado mesmo quando suas decisões e práticas não se refletem na narrativa desenvolvida sobre ele. Para além desta, existem outras formas de biografia que, em alguma medida, apesar de biografar o indivíduo, detém a intenção de evidenciar o tempo em que viveu este indivíduo. Também existem outras abordagens biográficas que desenvolvem uma narrativa sobre determinado sujeito com a intenção de denegrir sua imagem. Nesse sentido, acredito que antes de mais nada, se faz necessário analisar as biografias a partir dos elementos que informa suas produções. Somente após essas análises é que parece razoável verificar se os elementos que as constituem refletem uma abordagem que privilegia o sujeito, a sociedade e mesmo àquele que a propõe.
Espero ter respondido minimamente às suas indagações...
Forte abraço!
Fernando Roque Fernandes
ExcluirUniversidade Federal de Rondônia (UNIR)
Ótimo trabalho, bem didático e objetivo.
ResponderExcluirMinha questão está relacionada ao uso de outras fontes que possam dialogar com o modelo biográfico, considerando a Nova História como ocorre esse dialógo,por exemplo, com o Jornal e a fotográfia?
Girlane Santos da Silva
Cara Gislane Santos, saudações cordiais...
ExcluirAgradeço pela cordialidade!
Sobre sua questão, fico feliz que tenhas tocado no assunto das possibilidades documentais. Pois, durante muito tempo e ainda hoje, especialmente nas abordagens tidas como tradicionais, existem determinadas preferências em relação às entrevistas com os biografados, assim como com seus parentes e/ou descendentes. Também se privilegia testamentos, cartas, registros cartoriais e estórias locais de coragem, bravura e imponência, assim como monumentos públicos levantados nas praças como fontes potenciais de "heroicização" do biografado. Além disso, há uma profunda preocupação em evitar informações que ponham em xeque a "pureza" presente na trajetória de vida da personagem central da narrativa e/ou de sua família.
Nesse sentido, ao ampliar o leque de possibilidades documentais, as narrativas desenvolvidas sob a roupagem de Nova História evidenciam elementos insuspeitos sobre a vida do biografado. Para ficarmos nos exemplos mencionados por você, a utilização de jornais e periódicos como fontes evidencia representações que informam a tentativa de manipulação da opinião pública representada pelos editoriais jornalísticos, assim como traz a tona a necessidade de informações demandadas pela sociedade sobre determinados sujeitos. Ou seja, ao incluir os periódicos no rol de fontes de informação, o historiador enriquece sua narrativa e possibilita a ampliação de nossas percepções sobre o biografado. Também no caso das fotografias relacionadas ao biografado, estas possibilitam compreensões sobre o contexto em que viveu e informa sobre procedimentos de análises que acionam representações que informa o período em que o biografado viveu. Obviamente, quem está mais antenado nas metodologias de utilização destas fontes poderá apresentar elementos muito mais enriquecedores sobre o que mencionei aqui...
Espero ter sido minimamente aceitável nestas considerações...
Forte abraço e saúde à família!
Fernando Roque Fernandes
Universidade Federal de Rondônia (UNIR)
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirParabéns! Ótimo texto, de escrita clara e objetiva, muito didático e introdutório para quem está começando a pesquisar sobre o assunto.
ResponderExcluirUma coisa que me chamou muita atenção ao longo do texto foi a relação biografia x literatura, e o fato das pessoas optarem pela leitura de textos literários para conhecer um determinado personagem. Diferente de um literato, o historiador é preso a metodologias e regras tendo a finalidade de aproximar-se da verossimilidade histórica. A escola positivista teve fortes críticas relativas ao modo de se escrever história, sendo que esta deve estar fortemente pautada nas fontes e alinhada rigorosamente ao método científico. Neste caso, a história é ciência, as fontes são a reprodução do que ocorreu no passado, e a história que não obedece as regras, a "história envolvente", é considerada literatura.
Hoje em dia, vários historiadores recorrem à recursos literários para escrever e enriquecer a história. Em sua opinião, até que ponto convêm ao historiador apropiar-se destes recursos? qual o resultado prático disto na produção acadêmica?
Eu acho fantástico o historiador explorar as possibilidades e criar narrativas dentro de sua produção acadêmica, sendo esta também uma forma de atrair outros tipos de leitores e tornar a história mais envolvente, com um texto mais fluído, e creio que isso não traga "prejuízos" ao texto, mas sim, acaba o tornando mais rico, ao apresentar diversos quadros do que poderia ter acontecido em um determinado período/classe/local/sociedade/conjuntura.
Att, Nycole Schmitt Andrade.
Cara Nycole Schmitt, ola!
ExcluirAgradeço pelos elogios e participação...
Gostaria de pontuar algumas questões que apresentas:
1. Metodologias e Regras, assim como fontes passíveis de análises historiográficas não nos aprisionam. Na verdade, elas nos permitem ser, enquanto historiadores, um tipo de cientista com conhecimento específico, baseados em procedimentos de análise que privilegiam as ações dos seres humanos no tempo.
2. A verossimilhança histórica não deve ser entendida como uma fragilidade das narrativas historiográficas. Muito ao contrário, ela deve ser o reflexo do reconhecimento e da consciência que temos, enquanto historiadores, de que o conhecimento científico tem suas limitações epistemológicas.
3. Hoje, vivemos um momento de intensos conflitos epistemológicos. As críticas sobre o papel da História vem de todos os lados. Além, existe um embate interno entre as abordagens tradicionais (muito mais estáticas, por sinal. Com características metodológicas criadas até o século XIX) e as abordagens desenvolvidas a partir da primeira metade do século XX, na França, e familiarizados no Brasil a partir dos anos 1960, as quais tem se fragmentado desde então e provocado rachas dentro da própria historiografia.
4. História é História e Literatura é Literatura. Existe uma crítica literária importante sobre a historiografia. Ela desempenhou um papel basilar no renascimento da historiografia desenvolvida a partir dos anos 1990.
5. Todo produto da ação humana é fonte histórica. Se a Literatura é um produto humano...
6. A narrativa, tanto histórica quanto literária é um paradigma criado pela linguística. Nesse sentido, assim como os historiadores se apropriam do modelo narrativo literário, os literatos só teriam a ganhar com o modelo narrativo historiográfico. Além disso, independente do modelo narrativo, é preciso ter conhecimento do público para o qual a pesquisa desenvolvida se direciona, pois é ela que informa qual o melhor modelo narrativo a ser utilizado.
Espero ter alcançado suas expectativas. Fico feliz, pois refleti mais sobre a temática... Forte abraço.
Fernando Roque Fernandes
Universidade Federal de Rondônia (UNIR)
Caríssimo Fernando Fernandes, parabéns pelo texto objetivo e sucinto, traz reflexões muito inquietantes sobre a historiografia e também sobre a biografia…
ResponderExcluirGostei muito da sua colocação junto aos autores em que se referencia, os quais dialogam que o indivíduo de forma alguma está dissociado da sociedade e que isso fortalece a questão das trajetórias individuais para a Nova História, porque traz uma perspectiva de dentro pra fora, analisa o micro para analisar o macro.
Desse modo, gostaria de saber se esse tipo de análise também pode ser feita ao estudar História na Educação Básica ou por ser algo complexo, até mesmo para historiadores e literatos dialogarem, não seria uma metodologia viável para esse nível de educação?
Grata!
Beatriz da Silva Mello
Olá, meu amor!
ExcluirFico feliz que tenhas gostado do enredo...
Sobre a questão, penso que seja por esse caminho mesmo. Uma abordagem biográfica que privilegia as perspectivas apresentadas por aquilo que temos denominado de Nova História se fundamenta em referenciais sociológicos do final do século XIX e iníco do século XX. Especialmente naquilo que diz respeito às relações que envolvem o indivíduo e a sociedade.
Em relação às perspectivas de micro-análise, você aponta outro ponto interessante ao evidenciar que as novas abordagens biográficas problematizadas pela historiografia de tradição francesa, ao privilegiar determinadas questões mais específicas, acabam por se utilizar das influencias italianas, como no caso das reflexões apresentadas por Giovanni Levi sobre biografia e micro-história.
Enfim, no que se refere à dimensão educacional, se faz sempre necessário dialogar com outras áreas científicas, como no caso da pedagogia, psicologia e psicopedagogia, de modo que estas possam auxliar na identificação da melhor abordagem para trabalhar a temática da biografia com determinados níveis de desenvolvimentos etários e/ou cognitivos...
Espero ter contribuído de algum modo...
Beijos...
Fernando Roque Fernandes
Universidade Federal de Rondônia (UNIR)
Fernando, Tudo bacana?
ResponderExcluirPrimeiro, parabenizo-o pelo belo artigo. E apresento um comentário e uma questão:
1. Vejo como eficaz tecer um "esboço biográfico" a partir da produção literária de um escritor, por exemplo. Assim, partindo do tempo do enunciado de seus romances, novelas, contos, poemas, depois, relacionando com o tempo histórico da publicação dos mesmos, entretecendo tais temporalidades. Esse é um caminho árduo. porém, válido.
2. Como o teu artigo propõe uma discussão teórica eu tomo a liberdade de te fazer uma provocação, através das palavras de um autor que você não menciona do texto, porém, é fundamental, penso, para se pensar os limites de toda e qualquer narrativa biográfica:“[...], tratar a vida como uma história, isto é, como o relato coerente de uma sequência de acontecimento com significados e direção, talvez seja conformar-se com uma ilusão teórica, uma representação comum da existência [...]? ponho assim a interrogação no final dessa afirmação de Pierre Bourdieu (2016, p. 10), retirada do artigo "A ilusão Biográfica", na perspectiva de verificar qual é o teu posicionamento, claro, se você quiser.
Abraço fraterno
Arcângelo da Silva Ferreira
Meu querido Professor e amigo Dom Arcângelo Ferreira, saudações cordiais!
ExcluirFico feliz com sua presenta nesta página, obrigado!
Sobre suas indagações, seguimos:
1. Agradeço, especialmente, pelas considerações sobre a literatura como forma de representação do real, assim como os usos da literatura enquanto fonte histórica!
2. Fantástico! Ousaria dizer que não apenas a biografia, mas toda forma de manifestação historiográfica tem um "quê" de inconsistências que jamais serão fundamentadas. Dito de outro modo, no caleidoscópio das representações historiográficas, jamais poderíamos, ainda que na eternidade, preencher as lacunas de possibilidades de acontecimentos que permeiam o fato acontecido e pretensamente imaginado...
3. Ousaria dizer que o intitulado "Esboço de uma auto-análise" é, sem sombra de dúvidas o elemento pós-contemporâneo que informa uma ínfima possibilidade possível de apreensão da trajetória de determinados sujeitos que têm se constituído em metodologia de análise que privilegia a História das Ideais e, por isso mesmo, informa uma metodologia capaz de diminuir as possibilidades de desvios de análises. Ou seja, a produção de uma espécie de "biografia intelectual" de determinado sujeito pode sim, ser tomado como caminho possível para se evitar possíveis desvios de metodologia de análise científica.
Enfim, meu querido Professor, acredito que nossa experiência naquelas reflexões sobre a Questão Biográfica tenha despertado em nós aquilo que poderíamos denominar como "campo de possibilidades"!
Forte abraço!
Fernando Roque Fernandes
Universidade Federal de Rondônia (UNIR).
Prezado Fernando, parabéns pelo texto! Claro, didático e extremamente reflexivo a respeito do, ainda, polêmico “retorno” da biografia como objeto de produção acadêmica. Vou guardar esse artigo para ler mais vezes, pois tenho especial interesse no debate sobre os procedimentos metodológicos aplicados no estudo de trajetórias individuais.
ResponderExcluirEmbora seja bastante criticado no mundo acadêmico, o modelo biográfico tradicional, que privilegia o estudo sobre indivíduos ilustres, geralmente integrantes do campo político formal, em uma narrativa que destaca os aspectos psicologizantes, as curiosidades e a “jornada do herói”, do biografado – conforme explanado no seu texto –, ainda é bastante consumido pelo “público” (entre aspas, pois sabemos que os leitores são uma minoria se comparados com a totalidade da população brasileira) mais geral, isto é, não-acadêmico. Assim, a inclinação dos historiadores das últimas gerações dos Annales, e, mais recentemente, daqueles que se agruparam ao redor do que se convencionou chamar de Micro-História, em tornar a escrita historiográfica mais próxima de um artefato literário não seria parte de um projeto para, além de renovar epistemologicamente a História enquanto disciplina, também, popularizar a produção científica para além do campo acadêmico, utilizando para tanto um gênero literário popular, como a biografia?
Vitor Luiz Soares Figueiredo
Caro Vitor Luiz Soares Figueiredo, saudações!
ExcluirAgradeço pelos elogios e fico honrado com seu interesse sobre o tema...
No que diz respeito à sua questão respondo: Absolutamente!
Penso de Peter Burke, o qual tem pesquisado nos últimos anos sobre a História da Leitura, poderia ser uma melhor indicação para ampliar reflexões sobre a indagação que você apresenta.
No entanto, pelo que temos acessado, realmente, o Movimento dos Annales, percebeu que teria se desenvolvido, nas primeiras décadas do século XX francês, uma espécie de cultura letrada citadina. Parece que uma das estratégias criadas por este grupo foi a produção de modelos narrativos historiográficos que pudesses dialogar melhor com as linguagens e anseios dos leitores. Nesse sentido, o uso de narrativas biográficas, na França daquele período, parece ter sido uma estratégia editorial criada para alcançar a maior quantidade de leitores informais possíveis. Para tanto, se fazia necessário criar elementos que possibilitassem um melhor diálogo entre a realidade vivida e a narrativa contada em obras vendidas em bancas de jornais, por exemplo.
Emfim, não acredito que haja impedimento para a apropriação do modelo narrativo literário pela História. Mesmo porque os modelos narrativos são elementos da Linguística. Ou seja, tanto o modelo narrativo historiográfico quando o modelos narrativo literário são produtos da Linguísticas.
De todo modo, sou plenamente à favor da utilização de elementos literários na produção do enredo narrativo historiográfico...
Espero ter conseguido, de algum modo, contribuir com a problematização feita... Abraço!
Fernando Roque Fernandes
Universidade Federal de Rondônia (UNIR).