Márcia Elisa Teté Ramos


HOJE, ENSINAR HISTÓRIA É UM ATO POLÍTICO CONTRA OS REVISIONISMOS CONSERVADORES


Caso 1: “Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil”, de autoria de Leandro Narloch [2011] ameniza o caráter ditatorial do Regime Militar brasileiro, pois este não teria morto tantas pessoas como em outras Ditaduras Latino-Americanas.

Caso 2: "O português nem pisava na África. Foram os próprios negros que entregavam os escravos", disse Bolsonaro, então candidato à presidência, no Programa Roda Viva em 30 de setembro de 2018.

Caso 3: Rodrigo Constantino escreve para a Gazeta do Povo em 25 de novembro de 2019 matéria intitulada “Nazismo: o filho que a esquerda não assume”

São casos que expressam concepções, crenças e informações que não são exclusivas de algumas pessoas, mas circulam na sociedade, estão nas narrativas de gerações diferentes, nas múltiplas interações sociais, nos diferentes espaços, inclusive na escola. Por serem casos que expressam ideias que advém da mídia [no caso, livro, TV e jornal] atreladas a sujeitos relativamente conhecidos pelo público, são amplamente consideradas, respeitadas, acatadas, questionadas, criticadas e transgredidas. Como estas ideias se formam, como circulam, porque acabam tendo grande poder de cooptação na atualidade, são questões complexas de serem respondidas, mesmo porque se referem a um movimento recursivo: as ideias provenientes dos formadores de opinião tem a capacidade de influenciar um público, mas este público já teria certas ideias baseadas em seus códigos socioculturais que acabariam se reforçando mediante a influência dos formadores de opinião.

Os artefatos culturais midiáticos e/ou os sujeitos formadores de opinião não determinam/garantem a formação de todos os saberes públicos e o sujeito precisa ser visto como produtor ativo de sentido, que interpreta as mensagens recebidas conforme: classe, gênero, idade, religião, geração, profissão e etnia [Martín-Barbero, 2001; Ellsworth, 2001]. Mesmo levando em conta está afirmativa, consideramos que vivenciamos um contexto histórico, político e econômico que vem configurando a tendência de os sujeitos “assimilarem” as ideias conservadoras, muitas vezes preconceituosas e anticientíficas, privilegiando heranças e códigos culturais enraizados/disseminados no social, em especial, pela mídia. Há que se lembrar da formação social que experienciamos: tudo passa pela mídia, ou melhor, pela cultura midiática, e todos, de uma forma ou de outra tem acesso a esta cultura. Em outros termos: a cultura assume papel social constitutivo [Hall, 1998, p. 16]. Filtrada pela mídia, higienizada da questão econômica, se esvanece o fato de que as relações sociais são pautadas na exploração de uma ordem capitalista, pelo menos na ideologia/mentalidade que então vigora. Romper com esta dinâmica que confunde a noção de existência da [luta de] classes sociais, exige um senso crítico capaz de relacionar a experiência de classe com a mentalidade de classe para se criar intencionalidades que procurem se opor aos privilégios de classe. Como dissemos antes, tudo passa pela cultura midiática, portanto, para construir esta relação direta entre existência/experiência e modo de pensar/agir, cumpre usar também os mesmos canais midiáticos, “fazendo História Pública”. Enfim, o senso crítico, o empoderamento social depende da utilização do mesmo arsenal midiático que reelabora, deturpa, silencia, negligencia, e reforça concepções conforme interesses conservadores, e quando dizemos conservadores, nos referimos à classe social que quer manter, conservar, reproduzir determinada sociedade, sem buscar nela interferir para construir outra em que a justiça e a igualdade seja para todos.

Retomando os casos acima, mitigar, relativizar ou mesmo deturpar a escravidão, a Ditadura Civil-Militar brasileira e o posicionamento do Nazismo, seria ao nosso ver, criar uma história interessada em conservar uma sociedade que funciona a favor de uma classe favorecida pelo capital, transformando o passado em uma prova de que não havia outro caminho para trilhar que fosse outro, ou seja: se não fosse o escravismo, o país não teria progredido, e aquele sistema não foi tão exploratório que justifique hoje as políticas de reparação histórica; se não fosse a Ditadura, mesmo com alguns métodos radicais como a tortura, o comunismo teria estabelecido uma Ditadura Comunista no Brasil e, finalmente, o Nazismo é sim, um regime cruel e autoritário, um modelo de política de esquerda, igualado aos comunismo, socialismo, anarquismo e petismo.

Poderíamos citar outros fatos questionados pelo revisionismo conservador: o receio do chamado “marxismo cultural” [teoria da conspiração difundida nos círculos conservadores e da extrema-direita estadunidense desde a década de 1990 que diz respeito a uma suposta infiltração do marxismo nas sociedades ocidentais com o objetivo final de destruir suas instituições e valores tradicionais através do estabelecimento de uma sociedade global, igualitária e multicultural]; direitos humanos seriam uma ferramenta de dominação mundial e defendem apenas bandidos; Martin Luter King era anticomunista; a ideologia de gênero é um projeto de dominação feminista que destrói as famílias; os professores universitários são todos “esquerdistas” e a universidade pública não gera conhecimento útil; Paulo Freire era um doutrinador comunista.

Para Estevão Martins, o senso comum costuma operar mais com convicções, com certezas, enquanto o conhecimento histórico fundamentado trabalha com o verossímil, plausível e convincente, obtido pela metodologia da história e/ou pelo consenso/controle científico entre os historiadores [Martins, 2017, p. 38]. Por outro lado, o saber especializado/acadêmico da historiografia, as vezes propaga ideias anistóricas, porque distantes da ciência. Portanto, não há como separar completamente o senso comum da história especializada em termos de concepções, mas sim [re]pensar a questão da capacidade de circulação/difusão/cooptação destes saberes problemáticos e fazer circular outros mais elaborados do ponto de vista da ciência.

No caso da História especializada, que supostamente seria o lugar da ciência, algumas vertentes vêm se autodenominando revisionistas. Não há problema em fazer uma revisão da História, já que toda ciência requer reelaborações conforme novas descobertas. E não temo como objetivo neste texto retomar a origem do revisionismo [na esfera do Direito e depois da historiografia] ou outros revisionismos que não as duas vertentes principais. A historiografia se move seguindo a máxima estabelecida ainda no começo do século passado, isto é, segundo novos problemas, abordagens e objetos, bem como novas evidências. O revisionismo foi importante na desconstrução de estereotipias, no questionamento quanto à lógica do herói e do vilão na História, na inserção da mulher como sujeito histórico, na análise mais apurada sobre as histórias e as culturas indígena e negra etc. Este seria um revisionismo comum na década de 70, 80 do século passado, abraçado pela Nova Esquerda “ansiosa para expor os preconceitos do pensamento ocidental, burguês e primordialmente masculino” [Kakutani, 2018, p. 17]. Neste tipo de revisionismo, entendidos por alguns como marxista ou “esquerdista”, os historiadores procuravam reinterpretar “processos históricos [que] até então eram consensuais, seja como narrativas emanadas do Estado, ou mesmo narrativas acadêmicas bem estabelecidas” [Melo, 2014, p.19] e por isso pode ser denominado de revisionismo progressista ou crítico.


Os revisionismos implicam na História como terreno de disputa política, por isso o ensino de história não consegue despolitizar-se. Sempre a ideia de que existe uma História canônica, oficial, tradicional a ser descontruída, mas o revisionismo conservador passou a trabalhar mais com a retórica moralista, ou mesmo apologética em alguns casos, do que a partir de dados empíricos, evidências, acúmulo de pesquisas sobre o assunto e discussões conceituais, haja vista a reabilitação de Mussolini e a ideia de que o fascismo tem raízes na esquerda por De Felice ou as justificativas para os crimes nazistas contra a humanidade postas por Nolte [Melo, 2014; Sena Jr; Melo; Calil, p. 18, 2017].
Diante do exposto, podemos ver que o revisionismo não é prerrogativa brasileira e tem origens distantes de pelo menos 30-40 anos. Damien Melo considera que o revisionismo apologético em relação ao franquismo e ao salazarismo são próprios de um contexto de crise europeia, pois “para operar a retomada das condições da acumulação capitalista, nada melhor que a normalização de um passado ditatorial de modo a tornar mais ‘suportável’ viver sob um ‘estado de exceção permanente’.” [Melo, 2014, p. 47]. Podemos transpor esta consideração para o contexto revisionista da Ditadura Militar Brasileira como uma espécie de retrotopia, quando diante de [as vezes, suposta] crise, se tem nostalgia de um passado que provavelmente nunca ocorreu [Bauman, 2017].

Fazer uso e abuso do passado, seria produzir um revisionismo optando pelas ocorrências e evidências que corroboram determinado posicionamento o que não é prerrogativa, mas tendência de uma História escrita ou defendida pela direita liberal-conservadora. Por exemplo, o revisionismo em relação ao genocídio indígena, a escravidão brasileira e o racismo, certamente vincula-se às demandas de grupos que defendem o Estado Mínimo para superar a crise [palavra retomada constantemente para justificar práticas e ideais políticas, mais que econômico] em substituição ao Estado de Bem-Estar Social, que no Brasil, nem bem foi implementado. Portanto, o revisionismo conservador se vincula diretamente com um projeto social de exclusão.

Neste uso e abuso, diversas estratégias podem ser mobilizadas: omissão ou anulação de algum dado, informação ou acontecimento; valorização ou rememoração de algum dado, informação ou acontecimento favorecedor de determinada perspectiva e ofuscamento daquele[s] que não favorece[m]; descontextualização de narrativas, dados, informações e acontecimentos; optar por certa estatística em detrimento de outras; generalizar tomando um caso como explicador de todo contexto, etc. [Macdonald, 2019]. Montesinos [2007] entende que estas estratégias se vinculam à restauração da História Oficial, à mistificação ou ao empoderamento de determinadas identidades [da classe dominante]. O objetivo do revisionismo conservador, é, sobretudo, mais persuasivo do que científico e costuma ter como estratégia: a desqualificação da pessoa que testemunha certo fato que comprova acontecimentos, práticas e registros que se quer silenciar; também a desqualificação de personagens históricos [que estão do lado adversário] com algum detalhe, frase ou ação específica; generalização; linguagem persuasiva, afirmativa e imperativa; naturalização ou amortização de fatos violentos e/ou significativos; comparações entre dados, acontecimentos ou práticas muito diferentes; reduções quantitativas, entre outras.

Frente a tais estratégias de uso e abuso do passado, como lidar com o revisionismo em sala de aula? Qual revisionismo pode ser considerado válido? A seguir fornecemos algumas sugestões.

1 - Apreender o conhecimento prévio do aluno. O que os alunos sabem/pensam sobre a temática a ser estudada? A partir dos conhecimentos prévios dos alunos possibilita-se uma “potencialização” da aprendizagem histórica, pois estes são marcos a partir do qual os alunos darão significado aos conteúdos históricos escolares [Abud, 2005, p. 312]. Os procedimentos para obter os conhecimentos prévios dos alunos são diversos e vão desde realizar uma “tempestade de ideias” escrevendo no quadro as palavras com as quais os alunos associam com o assunto a ser estudado, desde um instrumento de pesquisa mais elaborado como o questionário ou a produção de uma história hipotética [Ramos; Ramos, 2019]. De uma forma ou de outra, utiliza-se um dispositivo de evocação, ou seja, uma estratégia para direcionar uma forma de conhecimento situacional. Ao aluno “...pede-se que pense em determinado recorte da realidade que se apresenta e que procure uma posição ou ponto de vista em relação a ela” [Edwards, 1997, p. 24].

2 - Relação passado-presente. O passado precisa ser avivado para o conteúdo histórico escolar ter sentido para o aluno, produzindo uma aproximação com a vida prática: “aprendizagem é estimulada quando as situações-objecto de conhecimento se apresentam significativas, com sentido pessoal” [Barca, 2009, p. 13]. Para Peter Lee, no contexto do ensino de história, é admissível a noção de “passado prático”, o passado deve então “servir” para a vida do aluno, permitindo que o presente faça sentido [Lee, 2008, p. 20]. Relacionar passado-presente seria problematizar buscando explicações históricas, lembrando das mudanças e permanências, lembrando da presença do passado no presente. Há a necessidade de os alunos se reconhecerem em uma determinada história, “de olhar para si mesmos e se autofirmarem” [Pereira; Seffner, 2018, p. 20]. O estudo do passado só tem valia se tratarmos dos “temas desestruturantes da vida dos jovens e da sociedade brasileira dos tempos atuais – que lhes permita compreender o que é presente e como se orientar nele, construir uma identidade, criar referenciais” [Pereira; Seffner, 2018, p. 21].

3 - Consideramos que por intermédio do emprego da metodologia da ciência histórica, utilizamos fontes históricas em sala de aula, e estas, provavelmente também serão encontradas no livro didático. A utilização da fonte documental remete ao fundamento do método histórico, aos processos necessários à construção do conhecimento histórico, seja pelos historiadores, seja pelos professores e alunos em sala de aula: “É preciso construir juntamente com a criança os meios para que ela entenda os procedimentos da construção historiográfica e como o historiador analisa os vestígios nos documentos para escrever história” [Cainelli; Tuma, 2009, p. 212]. Para Peter Lee, a construção do conhecimento histórico demanda um “compromisso de indagação” com as “marcas de identificação” da história, como “passado”, “acontecimento”, “evento”, “causa”, “mudança” etc., “o que requer um conceito de evidência” [Lee, 2006, p. 136]. A metodologia da ciência histórica desenvolvida na escola para construção do conhecimento implica em lidar com o que Isabel Barca chama de “princípio investigativo”, por isso nomeia o ensino pautado na pesquisa do professor e do aluno de aula-oficina [Barca, 2004]. A História-Ciência reúne fontes para “analisá-las, descrevê-las, explicá-las e narrar seu fio” e esses passos são passíveis de crítica, comparação, reformulação, confirmação, modificação, superação, complementação [Martins, 2017, p. 28]. Martins ainda defende que o ensino de história não pode renunciar, assim como no conhecimento histórico especializado, do “aprendizado gradual dos recursos metódicos com que se lida com as fontes da informação histórica” [Martins, 2017, p. 209].

4 - Introduzir o aluno na pesquisa. Também é importante fazer os alunos investigarem a temática, busquem a contextualização de determinado período para melhor interpretar/analisar as fontes históricas, já que estas não falam por si. O mundo digital talvez seja familiar à cultura do aluno, dependendo de sua condição socioeconômica, por isso seria adequado que o professor consultasse antes alguns sites para repassar aos seus alunos realizarem a pesquisa.

5 - O conceito de empatia histórica pode servir ao propósito de contextualização. Peter Lee diz podermos substituir a palavra “empatia” por “compreensão”. Mais precisamente: “compreensão histórica”, que não é apenas um sentimento, “Embora envolva o reconhecimento de que as pessoas possuem sentimentos” [Lee, 2003, p. 20]. A construção de identidade implica na construção da alteridade, e mais do que isto, uma forma de “se colocar no lugar do Outro” para entender e respeitar o que este Outro pensa, objetiva, necessita, vivência, rejeita, admira, questiona, etc. Porém, mais do que se colocar no lugar do Outro, “a nossa compreensão histórica vem da forma como sabemos como é que as pessoas viram as coisas, sabendo o que tentaram fazer, sabendo que sentiram os sentimentos apropriados àquela situação” [Lee, 2003, p. 21]. Embora a empatia seja fundamental para entendimento do Outro em nossa temporalidade, ela se distingue, quando histórica, por levar em conta, preferencialmente, os Outros de temporalidades passadas.

6 - Na história de vida pessoal ou coletiva, é mister perceber a complexidade. Um pensamento linear despreza a multicausalidade histórica. Se pensamos de forma unicausal, simplificada e imediata, para, por exemplo solucionar a violência, recaímos no [des]argumento sobre a necessidade de armar a população, aprisionar cada vez mais pessoas mesmo que as cadeias se encontram superlotadas, chegando ao extremo de defender a máxima “bandido bom é bandido morto” [Ramos, 2019]. Outro exemplo seria ver culturas ou grupos sociais por meio de estereótipos. Tendo como base o preconceito, o estereótipo nega a existência do Outro, sendo “um meio de simplificar e agilizar nossa visão de mundo” [Rodrigues, Assmar; Jablonski, 2015, p.204], para não dispender uma energia cognitiva para compreendê-lo. A causalidade simples “vê a causa como sempre vizinha do efeito ou muito próxima a ele” [Mariotti, 2000, p. 33]. Já o pensamento complexo, procura perceber “os múltiplos dados e ângulos de abordagem de um mesmo problema” [Mariotti, 200, p. 36], o contexto e a explicação mais completos possível.

7 - Multiperspectividade. Segundo Isabel Barca, existe uma multiplicidade de perspectivas em história, devido aos pressupostos e contextos diferenciados de produção histórica. Porém, ao contrário da abordagem relativista, devemos considerar os critérios intersubjetivos de validação das produções historiográficas, entre eles, o mais consensual, como já afirmamos, seria o da “consistência da evidência”. As fontes/evidências fornecem indícios sobre o passado, diferenciando uma abordagem ficcional da histórica [Barca, 2001, p. 30]. Peter Lee ainda nos alerta que compreender o Outro, ter empatia, nem sempre significa aceitá-lo ou compartilhar de sua cultura [Lee, 2003, p. 20]. Estevão Rezende Martins entende o método como controle intersubjetivo de qualidade cognitiva do conhecimento histórico: “Em nenhuma hipótese o imperativo metódico admite caráter aleatório ou arbitrário”, sendo que o controle intersubjetivo, “a admissibilidade plausível e verossímil do discurso historiográfico”, “faz parte do contrato social de qualidade historiográfica no trato do passado” [Martins, 2017, p. 22].

8 - Ao final do processo de aprendizagem avaliamos se os alunos têm a capacidade de argumentar de forma fundamentada e baseados no senso crítico, superando o senso comum restrito. O debate, a discussão, o confronto de perspectivas/narrativas, “o movimento entre sujeitos diferentes”, também devem integrar a construção do aprendizado histórico, na medida em que implica na “intersubjetividade discursiva, em uma relação aberta de comunicação racional-argumentativa” [Rüsen, 2010, p. 48]. Ivo Matozzi [2008] entende que a ciência histórica só existe em forma de narrativa, e, por sua vez, tudo que aprendemos sobre História deve-se ao que está em forma de narrativa. Em outras palavras, a construção da História depende em saber colocar este conhecimento em narrativa e a compreensão da História se dá por intermédio da interpretação desta.

Enfim, desconstruir revisionismos conservadores e compreender revisionismos progressistas subentende saber pensar historicamente:

“Pensar historicamente pressupõe produz bons argumentos sobre a questão e pressuposição relacionadas ao passado, apelando à validade da história e à plausibilidade de suas afirmações; Pensar historicamente significa aceitarmos que sejamos obrigados a contar histórias diferentes daquelas que preferimos contar; Pensar historicamente significa compreender a importância de se respeitar o passado e tratar as pessoas do passado como elas gostariam de ser tratadas e não saqueando o passado para servir a determinados interesses do presente” [Schmidt, 2009, p. 14]

Referências


Profª Drª Márcia Elisa Teté Ramos é professora de Metodologia do Ensino em História na Universidade Estadual de Maringá e professora, bem como coordenadora do Mestrado Profissional em Ensino de História.

ABUD, Kátia Maria. “Registro e representação do cotidiano: a música popular na aula de história”. Cadernos Cedes, Campinas, v. 25, n. 67, p. 309-317, set./dez. 2005.

BARCA, Isabel. Concepções de adolescentes sobre múltiplas explicações em História. In: BARCA, Isabel [Org.]. Perspectivas em Educação Histórica. Actas das Primeiras Jornadas Internacionais de Educação Histórica. Centro de educação e Psicologia, Universidade do Minho. 2001.

BARCA, Isabel. Aula Oficina: do Projeto à Avaliação. In BARCA, Isabel [Org.]. Para uma educação de qualidade. Atas da Quarta Jornada de Educação Histórica. Braga: Centro de Investigação em Educação [CIED]/ Instituto de Educação e Psicologia/Universidade do Minho. 2004.

BAUMAN, Zigmund. Retrotopia. Rio de Janeiro: Zahar, 2017.CAINELLI, Marlene; TUMA, Magda Madalena. “História e memória na construção do pensamento histórico: uma investigação em Educação Histórica”. Revista HISTEDBR On-Line, Campinas, n. 34, pp. 211-222. 2009.

EDWARDS, Verónica. Os sujeitos no universo da escola: um estudo etnográfico no ensino primário. Trad. Josely Vianna Baptista. São Paulo: Ática. 2007.

ELLSWORTH, E. Modos de endereçamento: uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In SILVA, T. T. [Org.] Nunca fomos humanos. Nos rastros do sujeito. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.

HALL, Stuart. “A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções culturais do nosso tempo”. In EDUCAÇÃO & REALIDADE, Porto Alegre, vol. 22, n.2, Jul-Dez, 1997, p. 15-46.


LEE, Peter. “Em direção a um conceito de literacia histórica”. Educar em Revista. Especial. Dossiê: Educação Histórica. 2006.

LEE, Peter. Educação histórica, consciência histórica e literacia histórica. In BARCA, Isabel. Estudos de Consciência Histórica na Europa, América, Ásia e África. Braga: Centro de Investigação em Educação/Instituto de Educação e Psicologia/Universidade do Minho, 2008.

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LEE, Peter. Nós fabricamos carros e eles tinham que andar a pé: compreensão das pessoas do passado. In: BARCA, I. [Org.]. Educação histórica e museus. Braga: Centro de Investigação em Educação; Instituto de Educação e Psicologia; Universidade do Minho Actas das Segundas Jornadas Internacionais de Educação Histórica. Braga - Portugal: Centro de Investigação em Educação/Instituto de Educação e Psicologia/Universidade do Minho, 2003.

MacDolnald Hector. Verdade. 13 motivos para duvidar de tudo que te dizem. Trad. Flavio Chamis. Rio de Janeiro: Objetiva, 2019.

MARIOTTI, Humberto. As paixões do ego. Complexidade, política e solidariedade. São Paulo: Palas Athena, 2000.

MARTÍN-BARBERO, J.; REY, G. Os exercícios do ver. Hegemonia audiovisual e ficção televisiva. Trad. Jacob Gorender. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2001.

MARTINS, Estevão C. de Rezende. Teoria e filosofia da história. Contribuições para o ensino de História. Curitiba: W & A Editores, 2017.

MATOZZI, Ivo. “Ensinar a escrever sobre história”. História & Ensino. Londrina, v. 14, p. 07-28 ago. 2008.


MONTESINOS, Antonio Bernat. Estratégias de revisionismo histórico y pedagogia del odio. Anuario de pedagogia. N. 9, 2007, p. 47-102.

PEREIRA, Nilton Mullet; SEFFNER, Fernando. “Ensino de História: passados vivos e educação em questões sensíveis” In: Revista História Hoje, vol. 7, n. 13, 2018, p. 14-33.

RAMOS, Márcia Elisa Teté. Ensino de História e Direitos Humanos. In: Vilmar Baggio. (Org.). Rumos da Educação. Veranópolis, RS: Diálogos Freirianos, 2019, vol. 5, p. 104-123.

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RÜSEN, Jörn. In SCHMIDT; Maria Auxiliadora; BARCA, Isabel; MARTINS, Estevão de Rezende [Org.]. Jörn Rüsen e o ensino de história. Curitiba: Ed. UFPR. 2010.

SCHMIDT, M. A. Literacia Histórica: um desafio para a educação histórica no século XXI. História & Ensino. Laboratório de Ensino de História. Vol. 15. 2019, p. 9-22.


31 comentários:

  1. Olá, Márcia Ramos, gostaria de parabenizar pelo excelente texto sobre um tema potente e pujante no âmbito historiográfico. Ao longo do texto, você trabalha com as noções de "revisionismo conservador" versus "revisionismo progressista", no entanto, o historiador Enzo Traverso, devido à confusão entre "revisão e revisionismo" histórico, tem sugerido que abandonemos o uso do termo "revisionismo" ou que sua menção seja apenas para nomear um debate datado, como você lida com essa provocação do autor?
    Além disso, se o revisionismo conservador tem pouco apreço ao debate e ao uso de fontes e metodologia próprios da História, pois, em último caso, são negacionistas, falar de revisionismo conservador X revisionismo progressista não seria colocar num mesmo plano de poder práticas distintas? Já que o primeiro escamoteia o saber histórico e o segundo propõe uma nova maneira de olhar o passado sem negar a sua veracidade?

    att.,
    Natanael de Freitas Silva

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    1. Olá! Obrigada pelo interesse em meu texto.
      Creio que o emprego do termo "revisionismo" apresenta este tipo de problema que você menciona. Mesmo assim, opto pelo termo por dois motivos interdependentes: 1) atualmente, na História Pública, ou seja, mas diversas esferas sociais para além da academia, circula muito mais este termo e 2) junto com esta premissa, vem a ideia de que de um lado temos a história-verdade e de outro a historia-mentira, sendo que vem se acentuando junto com a ascensão da extrema-diteita a noção desta última como advinda da escola e da Universidade. Lembrando que estou falando da História Pública, em um momento de desqualificação da ciência, da escola, da Universidade e de todos os seus profissionais. Tratar de revisionismo conservador e revisionismo progressista serve para marcar que não existe uma história como mentira ou como verdade, que este seria um falso problema. O que nos intetessa é
      propor, defender e legitimar a história como ciência. A história-ciência também se pauta ou deveria se pautar na revisão. Como ciência não pode ser entendida como verdade acabada, mas como pretensão de verdade. Uma verdade sempre revista, inacabada, em construção. Enfim, o termo revisionismo serve mais ao propósito de tornar uma discussão acessível ao grande público, relacionando a ciência da História com a necessária revisão de problemas, abordagens,temas...
      Se quiser ter acesso a mais informações sobre meus estudos, acesse marciaelisateteramos.com
      Muito obrigada pela pergunta e desculpe se não consegui responder de forma mais satisfatória.
      Abraço

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    2. Pode ver também: https://www.youtube.com/watch?v=s0QFwxODvnU&t=64s

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  2. Olá professora! Parabéns pelo artigo, muito esclarecedor e profundo como sempre!
    A conceitualização dos revisionismos progressista e conservador responde às condições postas, em diferentes períodos e contextos. No campo do revisionismo progressista, os novos problemas, objetos e abordagens são criados em resposta a novos protagonistas que ganham voz e questionam o discurso oficial e excludente.
    Por sua vez, o revisionismo progressista se vale de artifícios retóricos para, sem fundamentação científica, embater uma cruzada em nome da tradição, usando como argumento que sua revisão é tão válida como a progressista a despeito da carência técnica e metodológica.
    Dessa forma, mesmo seguindo suas sugestões para o combate do revisionismo em sala de aula, ainda encontro dificuldades para combater este discurso que usa a estratégia de apresentar respostas fáceis e sedutoras.
    Seria possível, sem abrir mão do rigor teórico-metodológico, encantar os estudantes com o ensino de história criterioso ?

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    1. Desculpa!! Esqueci de assinar:

      Jeferson José Gevigier

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    2. Oi Jeferson!
      Obrigada por ter lido o meu texto.
      A minha proposta é transpor a metodologia da história para l a sala de aula. Não é a chamada "transposição didática" como a tradução ou vulgarização do saber acadêmico para o saber escolar. É sim, o uso dos mesmos procedimentos do historiador (uso de fontes, pesquisa, referenciais, etc.). Se ficássemos apenas nesta proposta, certamente seria bem tedioso para o estudante. Contudo, dependendo da fonte histórica (música, HQ, filme, imagens, cartas, arquitetura, objetos, etc.), esta se torna estratégia didático-pedagógico e mais: trabalha com o lúdico. Neste texto não adentrei nesta questão, mas é um aspecto para trazer para o ensino de história: associar ciência, política, estética, lúdico e o didático. Algo que pouco tem sido pesquisado.
      Grande abraço!

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  3. São esclarecedores os percursos de seu texto sobre as possibilidades de revisionismos, além das posturas possíveis em sala de aula que levem a um pensamento mais complexo e distante de um revisionismo conservador. Como é lembrado, a formatação desse revisionismo conservador se faz em meios como jornais, canais de youtube, declarações de personalidades, ou seja, posicionamentos que se aproximam mais do senso comum e de uma linguagem coloquial, próxima ao seu público que ali se reconhece em posicionamentos, mas também na maneira de expressar. Nos diálogos entre academia e escolas, na busca por processos de construção de revisionismos progressistas, não seria fundamental nos determos mais no debate sobre a escrita da história, elaborar maneiras de expressão que tornem plausível para os alunos todo o percurso de entendimento e de aproximação da operação histórica?
    Mateus de Andrade Pacheco

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    1. Oi Mateus! Obrigada pela devolutiva. Infelizmente, os historiadores não cuidaram muito do interesse pelo que circula para além do seu próprio espaço, a Universidade. Mesmo neste espaço, as áreas voltadas para o ensino de história em termos de formação profissional ou pesquisa, tem como tradição serem desqualificadas. Por isso, recentemente, devido aos desdobramentos da onda neoconservadora, se vem prestando mais atenção em como funciona o chamado senso comum. Não estamos costumados em fazer videos, lives (agora que estamos fazendo mais!!!!), canais de youtube, livros acessíveis (como os de leandro Narloch), utilizando uma linguagem mais adequado ao universo cultural infanto-juvenil. Ao mesmo tempo que não estamos familiarizados com este universo, não temos o financiamento que certos youtubers e canais tem para produzem materiais midiáticos, muito mais atraentes e convincentes. Ao contrário: estamos sempre desfinanciados! É uma enorme batalha que exige muito compromisso do professor de história. Exige também conhecer nosso aluno. Quem é, o que pensa o que sonha... Para assim nos aproximarmos o máximo possível deste sujeito, para que possamos escolher caminhos didático-pedagógicos que façam a história ter significado para a vida deles. Defendo sim a construção do conhecimento histórico em sala de aula com os mesmos procedimentos do historiador, desde que o aluno seja reconhecido como sujeito de aprendizagem na sua pluralidade, como sujeito de saberes próprios e importantes, com suas vivências, experiências, sensibilidades e linguagens.
      Abraço e me desculpe se não respondi devidamente!

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  4. Olá professora, parabenizo a senhora pelo o texto poderoso e cheio de ideias atuais e que coloca todos que fazem parte da história em evidência. Diante disso, quando falamos da cultura midiática e do poder de influência que ela tem, questiono o como a cultura midiática tem sido uma arma na potencialização do revisionismo conservador? Assim, tem feito com que a educação e o ensino de história anule/exclua os fatos já desconstruido de uma historiografia tradicional?

    Att,
    Ana Paula Herrera de Souza

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    1. Oi! Obrigada pelos parabéns! Fico contente de você ter gostado do texto. Atualmente, o revisionismo conservador tem encontrado terreno propício na mídia para se espalhar. A mídia apresenta determinadas estratégias para produzir efeitos sobre o público. Efeito de proximidade, de atualidade, sensacionalismo, desqualificação do Outro, etc. Algumas estratégias eu coloquei no texto, mas existem várias. Como o que é da mídia sempre visa um público a todo custo, os agentes midiáticos se preocupam em compreender o universo simbólico do público para poder produzir estes efeitos. Na escola, o professor está pouco preocupado com isso. Ele não quer vender, quer ensinar, e muitas vezes (não podemos generalizar) ele se preocupa em ensinar bem, não em saber o que seu público (alunos) pensam. como disse, o que está envolvido com a mídia, comumente visa vender, visa o lucro. Por isso que o conservadorismo emplaca nesta esfera. Só no Estado Mínimo posso vender educação, saúde, segurança, habitação... Então se desqualifica tudo o que é público. Só no Estado Mínimo penso na meritocracia, assim tentando desmerecer as cotas raciais, por exemplo. Para economizar. Para minimizar gastos. Daí como faço para realizar este "desmerecimento"? Contando uma história de heróis brancos, homens e cristãos. Valorizando a história dos colonizadores. A história dos vencedores. Resumindo: cultura midiática tem a ver diretamente com vender, com privatização, por isso o conservadorismo é o posicionamento mais coerente para a mídia.
      Espero ter respondido.
      Abraço!

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  5. Parabéns pelo texto!!! Muito esclarecedor!!!
    Diante desses desafios, não seria importante abordar as diferenças entre história e memória, história e opinião, etc? Sobre a ditadura civil-militar, entendo que é muito importante essas diferenciações, sobretudo nesse contexto em que vivemos

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    1. Obrigada! Que bom que gostou do texto!
      Este é um texto muito resumido. poderia ter lidado melhor com outros aspectos. Mas quando me refiro à história como ciência, como aquela que deve ser construída em sala de aula, estou falando da diferença entre história e opinião. Quanto às discussões sobre memória e história, acredito que não devem ser postas em contradição, mas em relação. Devem ser vistas de forma mais complexa, pois a história, ao se distanciar da memória, das experiências, das vivências, das práticas do sujeito comum, pode se pasteurizar de tal forma que só produz significado ao pares (e olhe lá!). Ao mesmo tempo, a história vista como ciência, como sistematização da memória coletiva deve ser popularizada. Enfim, só história em seus rigores metodológicos e só a memória sem ser verificada pela ciência, não formam o conhecimento histórico. Memória e história não deve ser apartada uma da outra. Se perguntasse ao meu pai sobre a ditadura militar, ele diria que foi ótima, pois em sua memória, ele viveu um tempo bom. Já pela história ciência, podemos compreender que foi uma ditadura, que havia sim corrupção e inflação. Pela justaposição de ambas, posso retomar a memória daqueles que sofreram os percalços da ditadura. A memória do meu pai está errada? Não. Ele não sofreu na ditadura. O aluno deve entender que se o avô dele tem uma memória boa da ditadura, os aós de outros não tem. Que grupos tem memórias diferentes conforme o lugar de poder que ocupam na sociedade. Neste caso, seria interessante retomar alguns relatos, testemunhos, inclusive de alguns militares, sobre oque acontecia naquele momento.
      Abraço!

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  6. Olá professora, gostaria de parabenizá-la pelo ótimo texto, e, sanar algumas dúvidas. Ao longo do texto é falado sobre como podemos colocar aspectos da história em evidência, uma delas é sobre a cultura midiática, uma fator de grande influência na retirada de informações, muitas vezes carente de técnica e metodologia, já mais adiante, vemos algumas sugestões de como usar o revisionismo a nosso favor,porém vemos que em nossa sociedade existe uma variedade gigantesca de pessoas e seus respectivos níveis de conhecimento e busca pelo mesmo, diante disso, como deve ser feita a abordagem em alunos onde há a inserção de ideais conservadores em seu ambiente familiar? E o que fazer quando tais ideais interferem no processo de aprendizagem do jovem?
    Pedro Ícaro Pereira Álvares

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    1. Oi, Pedro! entendo sua preocupação em um momento que o cientista, o historiador, o professor vem sendo constantemente desqualificado na esfera pública. O professor já foi considerado como aquele que leva a "luz" a seus alunos. Hoje é aquele que "doutrina", que fala mentiras. Haja vista as perseguições do Escola Sem Partido.
      Eu recomendo não "bater de frente" com seus alunos. Não ser muito direto nas críticas. Não desmerecer os saberes que o seu aluno traz de casa, da rua, da Igreja. Se você for muito direto em seus questionamentos, só afastará seus alunos ainda mais do conhecimento.
      O processo de ensino e aprendizagem é lento e longo. Exige "diplomacia" do professor neste momento. É uma construção, e nada garante que você consiga fazer com que todos os seus alunos realizem esta construção do conhecimento histórico fundamentado.
      Abraço e espero ter respondido ou iniciado uma reflexão.

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  7. Boa tarde Professora Doutora!
    O fato de ter, o revisionismo conservador, aceitação ou não rejeição por uma parcela da sociedade adulta brasileira, pode ser tido como indicativo de falhas, lacunas ou até crise no ensino de História para as últimas gerações?
    Ou seja, a parcela social simpatizante ou que aceita como natural esse revisionismo conservador da História pode não ter tido uma formação histórico-político-social suficientemente eficaz para se posicionar com mais clareza ou com mais crítica?
    Pergunto-me se os adeptos são só a “clientela” do movimento em si ou se têm uma opinião formada de fato... mesmo que formada com base numa História que vem sendo reescrita pelo próprio movimento.
    Desculpe-me se minhas perguntas mostrarem pouco entendimento. Sou apenas uma caloura do curso de História, querendo aprender no processo de graduação.
    Grata pela atenção.
    Atenciosamente, Ligia Helena de Souza Chaves Badauy.

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    1. Ótima questão! Um pouco desalentadora, porque funciona mais ou menos como: "Onde foi que erramos?" E pode ter certeza que pesquisadores e professores fazem esta reflexão. Não acho que você mostra "pouco entendimento" mas uma preocupação de alguém que quer se compromissar com o ensino de história.
      Durante muito tempo o ensino de história foi se construindo em cima de uma tradição: aula expositiva; decorar nomes, fatos e datas; comemorar festas cívicas sem problematizá-las; responder linha por linha as perguntas que são encontradas no livro didático; seguir uma história eurocêntrica, linear, etc è um conjunto de práticas que se enraizou nas escolas (às vezes em universidades). Já há muito tempo estamos criticando estas práticas, mas elas são difíceis de romper. e mesmo assim nos chamam de doutrinadores... Mas te pergunto: Você, quando fez o ensino médio, o(a) professor(a) trabalhava com fontes históricas? Falava que diferentes autores poderiam ver um fenômeno histórico de modo divergente? Dava trechos de historiografia para vocês lerem? Indicava algum historiador? Na prática mesmo, a atualização é difícil de ocorrer, muitas vezes não por responsabilidade do professor, mas por falta de disponibilidade de tempo para planejar aulas, falta de datashow, colaboração da direção da escola, etc.
      Acho sim que o conservadorismo encontrou espaço porque temos professores mal formados, escolas desequipadas e um apego às tradições por serem mais fáceis de mobilizar na prática. Ultimamente, temos mais receio também, porque a nossa profissão vem sendo desvalorizada pelo poder público, o que acaba reverberando na sociedade. Por tentarmos enfrentar a ignorância e por sermos funcionários públicos considerados onerosos ao cofre do Estado.
      Você está começando. Eu já tenho mais de 25 anos de trabalho. Mas tanto eu como você, não devemos perder a esperança que as coisas mudem. Na minha experiência já pude ver que a realidade muda, as vezes para melhor, as vezes para pior.
      Abraço

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  8. Ótimo texto que nos apresenta os embates do ensino de história na atualidade com o advento tecnológico de massas aonde a internet pode ser tão perigosa quanto benéfica. Márcia existe algum ponto positivo no modelo de revisionismo apresentado no texto ??
    MARCOS JOSÉ SOARES DE SOUSA

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    1. Oi Marcos! Vejo de forma positiva o revisionismo progressista, pois se pauta na ciência, no conhecimento bem fundamentado. Já o revisionismo conservador, nos alertou no sentido de criar estratégias para desconstruí-lo. O historiador não tinha muita preocupação com a história que circula na História Pública. Só que esta história conservadora tomou tamanha proporção que os historiadores se voltaram para a reflexão sobre como produzir uma história acessível ao público, que se contraponha à história mal escrita, mal fundamentada, não-científica.
      Espero ter respondido
      Abraço

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  9. Oi, professora Márcia! 
    Gostei muito do seu texto! Ele me provocou a pensar diversas questões, sobretudo na lida com os "revisionismos" em sala de aula, ambiente em que, com a presença dos celulares, constantemente se contrapõem narrativas quase que simultâneas às que emitimos do lugar de professores e pesquisadores. Levando em consideração o revisionismo característico das décadas de 70 e 80, que nos trouxe novas abordagens, métodos e campos, na sua opinião, não seria mais coerente, do ponto de vista teórico, trabalharmos com o conceito de negacionismo histórico, ainda mais nos casos trazidos em seu texto, como tentativa mesmo de enfatizar a diferença existente entre essas "releituras"?

    Forte abraço,
    Caroline Trapp de Queiroz.

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    1. Oi Caroline! Obrigada pela excelente questão. Revisionismo não é o mesmo que negacionismo. Ambos são não-científicos, mas apresentam algumas diferenças. Exemplificando: sobre Ditadura militar, os negacionistas negam que houve ditadura (dizem que era uma democracia governada por militares), negam que existiu tortura, mortes, corrupção, desordem, etc. Os revisionistas vão dizer que houve ditadura, mas que ela foi importante no momento para impedir o avanço do comunismo; que torturou, mas apenas os desordeiros; que matou, mas não matou tanto como na Argentina.
      Outro exemplo: sobre o Holocausto. O s negacionistas vão dizer que não houve. Que os judeus mentem sobre isso. O revisionismo vai falar que houve, mas não matou 6 milhões de judeus, mas "apenas" 3 milhões.
      Por isso entendo que não tem como equiparar negacionismo com revisionismo.
      Abração! Espero ter respondido.

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    2. Muito obrigada pela resposta, professora! De fato, o conceito de negacionismo não dá conta dessas "releituras" que amenizam os fatos históricos sem, contudo, negá-los. Abçs!

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  10. Cara Márcia, boa noite.

    Excelente texto. Achei bastante inspirador. Agradeço a oportunidade.

    No entanto, uma questão não me foge à mente. Ela está no trecho abaixo:

    "Por outro lado, o saber especializado/acadêmico da historiografia, as vezes propaga ideias anistóricas, porque distantes da ciência. Portanto, não há como separar completamente o senso comum da história especializada em termos de concepções, mas sim [re]pensar a questão da capacidade de circulação/difusão/cooptação destes saberes problemáticos e fazer circular outros mais elaborados do ponto de vista da ciência."

    Se o negacionismo pode estar presente mesmo no interior da história acadêmica, como pode um ensino de história voltado ao fortalecimento dos métodos e das perspectivas da história-ciência dar conta? Afinal, historiadoras e historiadores acadêmicos, formadas(os) dentro das perspectivas críticas da história-ciência, produzem negacionismos mesmo com essa formação.

    Me parece que a questão é mais ético-política que metodológica. Gostaria de lê-la a respeito disso.

    Obrigado!

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    1. Oi João Carlos! Para responder sua questão vou lançar mão do conceito de intersubjetividade. Diz respeito à necessidade de haver um consenso entre historiadores sobre um fenômeno histórico. Um modelo de pesquisa histórica científica se reconhece por suas regras e padrões de práticas estabelecidos consensualmente e
      compartilhados pela comunidade de historiadores. Para não permanecer nem no exagero da subjetividade (relativismo) e nem da
      objetividade (determinismo), se regula o conhecimento histórico pelo diálogo permanente na comunidade pesquisadora, no entrecruzamento de perspectivas em um espaço de concordância. Pode haver divergência, revisionismos, desde que no mesmo espaço de procedimentos adotados pelos historiadores. Se ocorre de um ou dez historiadores irem contra o conhecimento acumulado por 1000 historiadores, eles não vão fazer a diferença na ciência. Agora, pode ocorrer destes pouquíssimos historiadores terem mais poder de intervir na História Pública incidindo no senso comum, do que aquele conjunto enorme de historiadores que trabalham com a ciência, mas ficam em suas torres de marfim. É neste sentido que produzi o texto que você fez referência.
      Por sua vez, o senso comum, sob mediação da escola, pode tornar-se senso crítico. Em outras palavras: a escola pode dar condições para que o aluno construa um conhecimento histórico fundamentado e este se espraia na sociedade.
      Na escola, é o professor que opta. Vai trabalhar com a história legitimada como ciência ou tratará da história pautada em um revisionismo conservador que costuma circular mais nos meios midiáticos? Vai escolher como fonte, trechos do "Brasil Nunca Mais" ou vai recorrer ao depoimento do coronel Ulstra sobre a ditadura? A história como conhecimento acumulado pelos historiadores já está feita ou está sendo feita, ela não vai ser refeita/revisada na escola! O que é feito na escola é adoção dos mesmos procedimentos do historiador, mas com a direção/orientação de um professor.
      Abraço e muito obrigada pela pergunta! Eu falo disso de forma um pouco mais apurada em um artigo http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/Dialogos/article/view/45349/pdf
      Tem outros em marciaelisateteramos.com

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    2. Pode ver também https://www.youtube.com/watch?v=s0QFwxODvnU&t=64s

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    3. Obrigado pela resposta, professora!

      Tenho plena concordância e acredito que discutimos pouco o que constitui esse "consenso comum", para ser bem redundante.

      Tenho trabalhado em minhas pesquisas com uma noção de "saber historiograficamente suficiente", embora ele levante outras questões (do tipo: suficiente para quem?).

      Tenho ressalvas com certa posição da educação histórica e da aprendizagem histórica, p. ex., pelo otimismo com que lidam com a possibilidade de uma literacia histórica ou racionalidade histórica como condições suficientes para enfrentar essa onda reacionária. Me parece que a questão é de dimensão ético-política e se refere mais à memória. Como construir memórias superadoras do senso comum, se faz parte da lógica de memória essa possibilidade de sedimentação acrítica? Eis a questão.

      Não sei se a história acadêmica, ou história ciência, nos bastaria em seu formato disciplinar, preocupada muitas vezes mais em tutelar os limites da memória que em dialogar em condições de igualdade com ela.

      Procurarei os demaos textos. Obrigado!

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  11. Marcella Albaine Farias da Costa20 de maio de 2020 às 21:15

    Professora Márcia, li com gosto seu texto. Bastante relação com o que você ponderou no Bate Papo sobre Ensino de História (link para quem quiser ver o vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=s0QFwxODvnU&t=64s).

    Na era das lives, como lidar, ao vivo, com comentários conservadores? Já ouvi depoimentos de colegas nesse sentido, que durante suas transmissões sofreram ataques no chat em função das temáticas que estavam sendo abordadas.

    Att,

    Marcella Albaine Farias da Costa.

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    1. Oi Marcella! Você fez a pergunta mais difícil de responder! (risos) Mas obrigada por ela. eu não tenho a fórmula não, mas já aconteceu comigo e agi de duas formas: 1) se der, se é só no chat, dependendo do teor, simplesmente ignoro, finjo que não vi ou 2) respondo educadamente retirando da minha alma todo elegância possível. Ninguém responde mal a alguém que foi bem educado. Se acontecer da pessoa insistir, "engrossar", eu simplesmente digo que sigo outra linha de pensamento, respeito a dele, mas que não adianta discutir, pois nunca se chegará a um acordo.
      Em Os Assassinos da Memoria, de Pierre Vidal Naquet, ele diz que o campo argumentativo pode ser tão divergente que não permite debate. Não há como conversar, pois o ponto de partida já é dicotômico, assim como todos os referenciais e pressupostos.
      Um grande abraço para você e aproveito para agradecer pela live! Esta é uma prática que deveria permanecer depois do COVID19.

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    2. Marcella Albaine Farias da Costa21 de maio de 2020 às 11:31

      Perfeito! Ainda não passei por nenhum situação como essa, mas tenho pensado sobre isso. Agradeço pela parceria e, sim, pretendemos continuar com o Bate Papo sobre Ensino de História após a pandemia.

      Abraço apertado,

      Marcella Albaine Farias da Costa.

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  12. Oi Marcella! Você fez a pergunta mais difícil de responder! (risos) Mas obrigada por ela. eu não tenho a fórmula não, mas já aconteceu comigo e agi de duas formas: 1) se der, se é só no chat, dependendo do teor, simplesmente ignoro, finjo que não vi ou 2) respondo educadamente retirando da minha alma todo elegância possível. Ninguém responde mal a alguém que foi bem educado. Se acontecer da pessoa insistir, "engrossar", eu simplesmente digo que sigo outra linha de pensamento, respeito a dele, mas que não adianta discutir, pois nunca se chegará a um acordo.
    Em Os Assassinos da Memoria, de Pierre Vidal Naquet, ele diz que o campo argumentativo pode ser tão divergente que não permite debate. Não há como conversar, pois o ponto de partida já é dicotômico, assim como todos os referenciais e pressupostos.
    Um grande abraço para você e aproveito para agradecer pela live! Esta é uma prática que deveria permanecer depois do COVID19.

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  13. Olá, professora Márcia Elisa, parabéns pelo texto!

    Os pontos argumentados por você nos levam a reflexão dos acontecimentos cotidianos que precisam ser discutidos em sala de aula. Um ponto destacado em seu texto, foi a relação passado-presente, que precisa estabelecer uma linguagem significativa com os conteúdos históricos, principalmente nesses tempos de revisionismo, conservadorismo e fundamentalismo religioso.

    A cultura midiática, também, muito tem contribuído para essa polarização política que tem feito de tudo para desqualificar a história, a ciência... o conhecimento.

    Diante disso, pergunto a você qual o seu entendimento sobre a circulação constantes dos memes entre os jovens e de que forma essa ferramenta pode contribuir para o ensino de História como um ato político em sala de aula?

    Abraços,
    Valdenira Silva de Melo.

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